Raça Indica

Raça Indica desta semana sugere os livros: Tudo nela é de se amar, de Luciene Nascimento e Raízes. Escritoras negras: resistência histórica, de Karine Oliveira.

 

Tudo nela é de se amar, de Luciene Nascimento

Uma das coisas que sempre chama a minha atenção quando começo um livro é a dedicatória. Depois de ler muita coisa, percebi que autores (as) negros (as),  geralmente, colocam em suas dedicatórias palavras que remetem a pertencimento, seja familiar, cultural ou geográfico. Às vezes, ao ler as poucas palavras de uma dedicatória, sinto como se tivesse sido transportada quase que instantaneamente para o momento do nascimento daquela pessoa. Foi assim que conheci Luciene Nascimento, por meio da dedicatória do livro “Tudo nela é de se amar”, publicado em 2021 pela editora Estação Brasil. 

Ela dedica o livro ao pai, à mãe, ao irmão e à cidade e finaliza: “já que deles sou síntese”. 

Fui com mais sede para as próximas páginas do livro que, em duas partes (“De dentro” e “Para fora”), apresenta uma série de poemas, memórias e, de alguma maneira, indica os processos e caminhos que a autora percorreu para construir cada uma das palavras, frases e versos ali contidos. Algo que já tinha visto recentemente no livro “Contos Negros”, de Ruth Guimarães.

“De dentro”, a primeira parte do livro, é visceral. É um grito de liberdade, um encontro com cada parte do corpo de uma mulher negra, inclusive, com suas mágoas, alegrias, força e sensibilidade. O poema que mais me tocou foi “Neguinha metida”: 

[…] Neguinha metida 
costuma ser aquela mulher
que não passa desapercebida
porque não está no ambiente 
para servir. 

Certamente, boa parte das mulheres negras que conheço se identificariam com o poema. 

Na segunda parte, “Para fora”, já consciente de si, ela não só apresenta seus pensamentos em forma de texto, mas também faz conexões profundas com o externo, com os laços familiares, com as coisas simples do cotidiano (inclusive, apresenta um poema homônimo), por vezes, excludente, discriminatório e racista. 

O último poema, “Oração das três Marias ou ladainha da senhora de si”,  chegou em mim como um chamamento à irmandade. Nele, Luciane Nascimento, em tom imperativo, infla as mulheres a reagir.

O livro traz prefácio de Lázaro Ramos e ilustrações belíssimas de Mariana Sguilla. 

Segundo o site da editora, Luciane Nascimento é de Quatis, no Estado do Rio de Janeiro. É advogada, maquiadora, escritora e poeta. Foi vencedora do Prêmio Dandara e Zumbi dos Palmares na categoria Comunicação. Atualmente, é vice-presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Barra Mansa (RJ). O livro pode ser encontrado no site da editora e em grandes livrarias. https://sextante.com.br/autores/luciene-nascimento/

 

Raízes. Escritoras negras: resistência histórica, de Karine Oliveira

Organizado por Karine Oliveira, o livro publicado em 2018 pela Editora Venas Abiertas, apresenta vinte mulheres negras e suas produções literárias. Lá estão poesias, contos, crônicas e outras formas de narrativas, que descrevem de maneira particular um pouco do pensamento delas, na sua singularidade e também enquanto mulheres negras brasileiras. 

Além dos textos dessas vinte autoras, não faltam citações de Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo, Angela Davis, bell hooks, Chimamanda Ngozi Adichie, Iracema de Jesus dos Anjos, Audre Lorde, Thássia Reis, Ellen Oléria, Jarid Arraes, Luiza Bairros, Sueli Carneiro, Nívia Sabino e Cristiane Sobral, o que, de alguma maneira, vai costurando o pensamento dessas mulheres convidadas, ou convocadas pela organizadora do livro, a partir de uma rede social. 

A proposta é, de fato, apresentar ao público leitor a diversidade da produção literária das mulheres negras deste tempo. Aliás, uma das coisas que mais tem me mobilizado para escrever essa coluna é exatamente a descoberta quase que cotidiana da diversidade da produção literária de pessoas negras. 

O livro contém textos de Aline Oliveira, Bruna Tamires, Caroline Anice, Dalva Maria, Elânia Francisca, Flor Priscila, Giovanna Heliodoro, Júlia Gomes, Juliana Jesus, Juliana Lino, Karine Bassi, Laura Oliveira, Nágila Oliveira, Negra Julie, Regiane Martins, Silvana Rodrigues, Taynã Fernandes, Thabata Cristina e Zaine Lima. A orelha é assinada por Cidinha Silva, autora de “Parem de nos matar”, entre outras obras. 

Mundo da Rua Podcast

Acompanhe também as sugestões de livros produzidos por pessoas negras, para pessoas negras e sobre pessoas negras, da nossa colunista Rachel Quintiliano, no podcast Mundo da Rua. No último episódio ela fala do livro Olhos D’água, de Conceição Evaristo.

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Jornalista com experiência em gestão, relações públicas e promoção da equidade de gênero e raça. Trabalhou na imprensa, governo, sociedade civil, iniciativa privada e organismos internacionais. Está a frente do canal "Negra Percepção" no YouTube e é autora do livro 'Negra percepção: sobre mim e nós na pandemia'.

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