Mulher é questionada por filha ter nascido branca
Casada com um homem branco, Ena Miller teve uma filha que nasceu com a pele clara, o que gerou situações de preconceito para a família
“Pare de perguntar se filha é minha porque sou negra e ela é branca”. A filha de Ena Miller nasceu com um tom de pele diferente do de sua mãe. Prematura, Bonnie estava internada na UTI e quando pode ser cuidada pela mãe houve o primeiro impacto sobre a diferença entre elas. Segundo Ena, uma mulher colocou a cabeça na porta do quarto para saber se ela ia tomar café da manhã e questionou a mãe: “Esse é seu bebê?”. A mulher ainda complementou com comentários como “Ela parece tão branca. Olhe para o cabelo, é tão liso. É tão branco…”
O modo invasivo com que as pessoas questionavam Ena sobre o tom de pele e as características ligadas à branquitude que sua filha carrega, como o cabelo liso, são motivos de muito incômodo para a mulher que é casada com um homem branco.
Mesmo os familiares e amigos de Ena Miller fizeram comentários sobre a pele de sua bebê. Ela afirma que para as pessoas próximas para as quais enviou fotos, a resposta imediata eram comentários incômodos. “Ela é muito branca”, Prefiro a foto que ela parece mais africana”, foram respostas que Ena recebeu.
“Bonnie e eu passamos cinco dias sozinhas no hospital. O parto aconteceu durante a primeira onda da covid-19 e as visitas não eram permitidas. Meu parceiro só conseguia nos ver através das chamadas vídeo do WhatsApp, e isso significava que ele tinha muito tempo para pesquisar na internet e se preocupar com os comentários das pessoas. Será que elas presumiram que eu não era a mãe de Bonnie? Será que minha filha teria que explicar quem eu era o tempo todo? Todos sempre pensariam que eu era a babá?
Eu não estava preparada para lidar com isso”, afirma.
A miscigenação é um assunto sensível para muitas famílias no Brasil e no mundo. Apesar de os casamentos inter-raciais não serem maioria das uniões registradas, pessoas negras que escolhem se casar com não-negros ainda são questionados porque existiu e ainda existe a tentativa de apagamento das tradições africanas e pela herança que as políticas de extermínio de povos negros deixou.
A psicóloga e fundadora do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, Cida Bento é conhecida pelos estudos sobre a branquitude no Brasil e fala a respeito do “investimento na construção de um imaginário extremamente negativo sobre o negro, que solapa sua identidade racial, danifica sua autoestima, culpa-o pela discriminação que sofre e, por fim, justifica as desigualdades raciais”.
É importante respeitar a individualidade de pessoas negras, entender contextos e notar que a branquitude colocou em nós um auto ódio que nos torna ainda mais críticos sobre nós mesmos e nos afasta.
Fonte: BBC