Com a palavra, Maria Nilda de Carvalho Mota, a Dinha

Na semana passada e nesta, resolvi abrir espaço desta coluna para veicular duas entrevistas, com o objetivo de disseminar o pensamento negro e feminino, em alusão às celebrações do Julho das Pretas, quando comemoramos a mulher negra latino-americana e caribenha. A primeira entrevista foi com a Marise de Santana e a segunda, com a Maria Nilda de Carvalho Mota, a Dinha. 

Dinha é poeta, editora independente e pós-doutora em Literatura e Sociedade pela Universidade de São Paulo.

Revista Raça. Que tipo de literatura você faz? A quem ela está endereçada? 

Dinha. Faço literatura negra, feminina, periférica e nordestina expatriada. Por baixo de todos esses rótulos, é também uma literatura universal, porque toca o que temos de essencialmente humano. 
Primeiro, eu escrevo pra minha comunidade, minha classe.  Depois, pra humanidade. 

Revista Raça. Há dez anos, você e outras mulheres da periferia criaram a Me Parió, uma editora. Por quê? 

Dinha. Criamos porque prezamos a liberdade mais do que o glamour. rsrs.
Porque a gente é um bando de mulher foda.
E porque o mercado editorial é capitalista, branco, masculino e heterossexual demais pras coisas que desejamos publicar. 

Revista Raça. Quais são os principais aprendizados desse processo? 

Dinha. São muitos. Desde os técnicos, do passo a passo da edição, diagramação, tradução (coisas que nós mesmas fazemos), entre outros, até os relacionais. Esses são tão importantes quanto. 
Reforçamos a crença de que dinheiro não é tudo. Nem mesmo a qualidade estética das obras.
Fortalecer mulheres e abrir caminhos, além de construir modos alternativos ao capitalismo, é a chave da nossa existência enquanto Me Parió

Revista Raça. Outro dia, a escritora Djaimilia Pereira de Almeida comentou que existe, neste momento, um certo interesse pelo que mulheres negras escrevem ou têm a dizer. Você acredita que essa é uma oportunidade ou uma cilada para as escritoras negras? 

Dinha. Nossa vida é uma eterna cilada.
Por um lado, tem a questão de entregar nosso ouro, nossos segredos a quem só quer usá-los como distração, ou transformar em arma contra nós. 
Mas tem o fato de sermos maioria, enquanto população. Quantas mais de nós escreverem, são mais paradigmas criados, pra além dos estereótipos comuns atribuídos a nós. 
Sou do time que defende a escrita, mas faço a ressalva: melhor falar mal das outras classes e lavar nossa roupa suja, entre em casa mesmo.

Revista Raça. Que sonhos, desejos ou planos você tem para as mulheres negras, periféricas e independentes que escrevem?

Dinha. Que se sintam plenas e respeitadas na sua diversidade. E que consigam viver da sua arte, aquelas que assim o desejarem.

Crédito da foto: Jaiane Conceição. 

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Jornalista com experiência em gestão, relações públicas e promoção da equidade de gênero e raça. Trabalhou na imprensa, governo, sociedade civil, iniciativa privada e organismos internacionais. Está a frente do canal "Negra Percepção" no YouTube e é autora do livro 'Negra percepção: sobre mim e nós na pandemia'.

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