Jogos Olímpicos: Mulheres Negras, Discriminação e Superação.

Zulu Araújo

O inventor dos Jogos Olímpicos Modernos, Pierre de Coubertin, tinha a convicção de que por meio dos esportes os países europeus teriam a forma mais eficiente para “educar e civilizar” os povos colonizados. Melhor dizendo, controlar e subordinar esses povos.

Ele era tão convencido com seu próprio argumento, que pregava abertamente que os africanos só deveriam praticar as modalidades individuais, visto que as coletivas poderiam servir de inspiração para revoltas e rebeliões.

É bem verdade que o “racismo científico”, além de inspirar essas ideias, também deu uma forte contribuição para a consolidação do racismo, ao afirmar e “comprovar” a superioridade dos brancos sobre as demais raças, em particular a raça negra.

É dessa convicção, de origem europeia, que se consolidou a ideia de que determinadas modalidades não seriam adequadas para os negros. Exemplo disso, foi no campo da natação, onde inúmeros estúdos afirmavam que a massa corpórea dos negros era inadequada para esse esporte. Daí, aos negros só deveriam caber o atletismo e as lutas.

Essa ideia era tão forte no Brasil, que muitos clubes proibiam a presença de negros nas suas piscinas. Ou seja, na concepção da Olimpíada, sempre houve o objetivo da separação racial nos esportes.

Para o Professor e Pesquisador da USP, Neilton Ferreira Júnior, que escreveu “Olimpismo negro: uma antologia das resistências ao racismo no esporte”, esse argumento é uma grande mentira:   

“Mas não são diferenças biológicas que imediatamente determinam o resultado de uma prova intelectual ou de uma prova esportiva. A ideia de que vou preparar um atleta para que ele possa obedecer algum tipo de destino é totalmente falsa e já foi desmentida desde os anos 1970”,

Dando um salto para as Olímpiadas de Paris (2024), apesar dos resquícios racistas ainda presentes, a exemplo do que ocorreu com a atleta argelina (boxeadora) Imane Khelif, que foi vítima de uma onda de fake news, além do discurso de ódio, contra os islâmicos, bem como a lamentável manifestação racista da seleção de futebol argentina para com os atletas migrantes da França, muita coisa mudou.

E a presença brasileira é um claro exemplo dessa mudança de paradigmas nos Jogos Olímpicos.

A maioria das medalhas conquistadas até o presente momento, o foram por meio das mulheres negras, (Bia Souza, Rayssa Leal, Rafaela Silva, Rebeca Andrade), com destaque especial para as duas medalhistas de ouro – Bia Souza (Judô) e Rebeca Andrade (ginástica). Sendo que Rebeca, é até o momento, a atleta que detém o recorde de medalhas conquistadas por uma só atleta no Brasil.

Mas, apesar de todos esses feitos, liderados inicialmente pelo fenômeno Daiane dos Santos, todas as atletas de uma forma ou de outra, revelaram as discriminações e falta de apoio que sofrem no desenvolvimento de suas carreiras. Do mesmo modo, todos elas celebraram o fato de serem – mulheres e negras.

Isso não é pouca coisa, ainda mais, para um país que continua ostentando os maiores índices de feminicidio, particularmente contra as mulheres negras e de assassinatos de jovens negros. É a superação, no sentido mais concreto que essa palavra pode ter.

Ou seja, com luta, sacrifício e muita, mas muita determinação essas jovens negras estão demonstrando para o Brasil de que outro modo de tratar a nossa juventude é possível, basta que lhes sejam dadas as condições e oportunidades.

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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Mestre em Cultura e Sociedade pela Ufba. Ex-presidente da Fundação Palmares, atualmente é presidente da Fundação Pedro Calmon - Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.

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