Revista Raça Brasil

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Atos de racismo e xenofobia no trabalho podem levar à demissão

Casos de discriminação no ambiente profissional têm levado a demissões por justa causa e acendido o alerta sobre o respeito nas relações de trabalho

Comentários que parecem “brincadeira”, piadas sobre sotaque ou ofensas veladas não são mais tolerados no ambiente de trabalho — e nem devem ser. Atitudes como racismo e xenofobia vêm sendo cada vez mais reconhecidas como faltas graves pela Justiça, e podem levar à demissão por justa causa.

De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), mais de 16 mil ações foram registradas em 2023 com o tema da discriminação no trabalho. E, dentro desse cenário, casos envolvendo racismo e xenofobia se destacam tanto pela frequência quanto pela gravidade.

A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) permite que empresas desliguem funcionários por justa causa em situações de falta grave. E é justamente com base nisso que muitas demissões vêm sendo confirmadas nos tribunais, especialmente quando há ofensas que ferem a dignidade de colegas.

Além da legislação trabalhista, a Constituição Federal reforça a gravidade do racismo, classificando-o como crime inafiançável e imprescritível — ou seja, que não pode ser perdoado por fiança e nem prescreve com o tempo.

Casos reais mostram o impacto

Em Campinas (SP), um operador de produção perdeu o emprego depois de ofender colegas haitianos durante o intervalo, chamando-os de “macacos”. Mesmo fora do expediente, o comportamento foi considerado grave o suficiente para a demissão, confirmada pela Justiça.

Outro episódio aconteceu no interior paulista: uma gerente, durante uma reunião, disse que o sotaque de uma funcionária nordestina era “insuportável” e “preguiçoso”. A colaboradora procurou apoio no sindicato e registrou boletim de ocorrência. Após uma apuração interna, a empresa demitiu a gerente por justa causa — decisão que também foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15).

Para o advogado trabalhista Marcos Antônio, a Justiça tem avançado ao olhar com mais atenção para o lado da vítima. “Não importa se a pessoa quis ou não ofender. O que pesa é o impacto da fala. ‘Era só uma piada’ não justifica mais”, explica.

Nem sempre há justiça

Apesar dos avanços, nem todos os casos têm um final justo. Vinicius Alves, que trabalhou como auxiliar administrativo em uma empresa de transportes, conta que foi alvo de comentários xenofóbicos por parte de um superior.

“Me chamaram de burro e disseram que meu erro era porque eu tinha ‘pescoço curto de cearense’. Falaram até que meus pais passaram fome no sertão”, relembra.

Vinicius procurou ajuda na empresa, mas o agressor recebeu apenas uma advertência informal. Pouco tempo depois, foi ele quem acabou sendo demitido. Casos como esse mostram que a aplicação da justa causa depende da postura da empresa diante da denúncia.

De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), as empresas têm a obrigação de apurar os fatos com seriedade, garantir o direito de defesa ao acusado e acolher a vítima de forma responsável. Quando necessário, devem também acionar os órgãos competentes.

O preconceito tem um preço

Em 2023, uma rede de supermercados em São Paulo foi condenada a pagar R$ 180 mil em danos morais coletivos depois que investigações comprovaram que gestores usavam apelidos ofensivos contra funcionários estrangeiros. As práticas eram recorrentes e continuaram mesmo após denúncias internas.

Segundo dados do TRT-15, entre 2022 e 2023, os processos envolvendo demissões discriminatórias cresceram 47%, com mais de 1.200 ações só no primeiro semestre de 2024. Entre as denúncias, estão racismo, xenofobia, homofobia e capacitismo.

Embora ainda não existam números exatos de demissões exclusivamente motivadas por preconceito, os relatos, as decisões judiciais e os levantamentos apontam uma tendência clara: o ambiente de trabalho está mudando — e atitudes discriminatórias não têm mais espaço.

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