Cinco anos se passaram desde a morte de Miguel Otávio Santana da Silva, um menino negro de 5 anos que caiu do nono andar de um prédio de luxo no centro do Recife, em 2 de junho de 2020. Cinco anos de dor, de luto, de ausência e de impunidade.
A mãe de Miguel, Mirtes Renata, deixou o filho sob os cuidados de Sari Corte Real, a então patroa e primeira-dama de Tamandaré, enquanto descia para passear com o cachorro da família. Sari, sem qualquer preocupação com a criança que lhe fora confiada, permitiu que Miguel entrasse sozinho no elevador. O menino, desorientado, subiu até o nono andar e, ali, caiu para a morte.
O caso ganhou repercussão nacional não apenas pela tragédia em si, mas pelas camadas de desigualdade e racismo que ele expôs. Enquanto Mirtes cumpria suas tarefas como empregada doméstica, em plena pandemia, a patroa, que representava o poder, a elite e o privilégio, agiu com negligência. E, mesmo assim, foi beneficiada por um sistema que sempre parece ter um olhar compassivo para os seus iguais.
Sari Corte Real foi condenada a oito anos e seis meses em regime aberto por abandono de incapaz com resultado em morte. Uma condenação branda, que permite que ela siga sua vida frequentando a faculdade, convivendo em sociedade, reorganizando seus dias como se nada tivesse acontecido.
Enquanto isso, mais uma família negra convive com o trauma irreparável da perda de uma criança. O quarto de Miguel permanece vazio, sua mãe luta por justiça com a mesma força que luta para seguir vivendo. A dor de Mirtes é o retrato de tantas outras dores negras ignoradas, silenciadas, deslegitimadas.
A justiça, que se pretende cega, na verdade só fecha os olhos quando quem está no banco dos réus é branco e rico. Quando o corpo no chão é negro e pobre, ela os abre bem, com pressa de punir, condenar, prender.
O caso Miguel não é uma exceção é regra! É parte de uma engrenagem que protege os privilegiados e descarta os vulneráveis. O Brasil, país que diz não ser racista, continua enterrando seus meninos negros enquanto oferece segunda chance, silêncio e conforto aos responsáveis.
Miguel deveria estar vivo. Correndo, crescendo, aprendendo a escrever seu nome com todas as letras. Mas foi interrompido. E sua morte, apesar de ter um nome e um rosto responsável, segue impune no que mais importa: na consciência da sociedade e no peso da justiça.
Hoje, cinco anos depois, seguimos repetindo: a justiça brasileira não é cega ela enxerga, sim. Enxerga a cor da pele antes de julgar