A exposição O Avesso do Tempo, do artista beninense Roméo Mivekannin, chega ao Brasil substituindo figuras brancas de obras do Louvre por autorretratos negros. Sua releitura de A Balsa da Medusa questiona quem é representado na história da arte, mas também revela o paradoxo de um sistema que limita essa crítica aos próprios espaços que antes excluíam essas vozes.
Mivekannin vai além da pintura: usa lençóis europeus de brechó, purificados com ervas, e insere cartas às figuras originais, seguindo tradições voduns. No entanto, há um risco: museus como o MAM-BA podem transformar essa arte anticolonial em mero capital cultural, sem mudar suas estruturas.
Em paralelo, Brasil Ilustrado expõe gravuras de Debret que retratam violências escravistas – censuradas na França do século XIX, mas banalizadas no Brasil como ilustrações didáticas. Artistas como Eustáquio Neves ressignificam essas imagens, denunciando como o país ainda evita confrontar seu passado colonial.
A Temporada França-Brasil, que traz ambas as mostras, revela assimetrias: enquanto a França revisa seu acervo com curadorias “diversas”, o Brasil trata obras como as de Debret como documentos neutros. A programação em 15 cidades é ambiciosa, mas será suficiente para ir além do simbolismo?
Mivekannin e os artistas brasileiros exigem mais do que revisitar o passado: querem ações concretas, como a devolução de acervos pilhados. Se a arte pode ressignificar a história, as instituições precisam fazer mais do que exibi-la – ou continuarão a quebrar metáforas, mas não as vitrines que as aprisionam.