Revista Raça Brasil

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O artista negro que pintou liberdade em cores

Nem todo artista cabe numa moldura. Djalma do Alegrete foi um desses. Negro, homossexual, gaúcho, filho de família abastada, ele nasceu num mundo que parecia já ter decidido onde queria que ele ficasse. Mas Djalma não aceitou ficar num cantinho escuro — escolheu viver no palco, no Carnaval, nas telas pintadas e nos tecidos bordados de brilho.

Filho de Dinorá e Homero, criado em Alegrete, ele cresceu cercado de expectativas: queriam que fosse engenheiro. Mas o menino preferiu mergulhar nas tintas, nos versos, nos palcos, nos figurinos. Fez arte como quem respira. E transformou dor em cor.

Mesmo estudando com grandes mestres, sentiu na pele as portas que se fecham para quem é negro e para quem ama do seu jeito. Foi barrado até na porta da prefeitura de Porto Alegre, mesmo sendo o homem por trás do deslumbrante traje usado por Ieda Maria Vargas, a Miss Universo brasileira em 1963. Lá fora, aplausos. Aqui, racismo. Dói dizer, mas foi assim.

Mas Djalma não se deixou reduzir. Ele inventou seu próprio mundo. Era pintor, figurinista, poeta, ator, carnavalesco, professor. Em cada obra, um grito de liberdade. Nos seus quadros, nas suas fantasias, existia tudo aquilo que muitos queriam esconder: corpos livres, cores vibrantes, religiosidade afro-brasileira, amor, dor, orgulho.

Em plena ditadura militar, Djalma ousava viver sem pedir licença. O Carnaval foi seu templo de resistência, onde corpos, vozes e cores podiam ser o que quisessem — ainda que fosse só por alguns dias.

Em 1991, ele fez questão de gritar ao mundo: “Preto é cor, negro é consciência.” Essa foi a mensagem da sua exposição no MARGS, onde também lançou o livro “Rio Grande do Sul: Aspectos da Negritude”, ilustrado por ele mesmo, celebrando a força e a história do povo negro gaúcho.

Djalma se foi em 1994, mas sua arte e seu nome continuam vivos. Agora, está sendo lembrado por João Batista Conceição, professor, advogado, escritor e sambista apaixonado, que prepara um livro sobre 20 negros gaúchos que mudaram a história. Entre esses nomes, Djalma brilha — como sempre brilhou.

A história de Djalma do Alegrete nos lembra que viver é um ato político. E que a arte pode ser o maior grito de liberdade que existe. Ele pintou a vida como queria — com coragem, cores e verdade. E, por isso, continua inesquecível.

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