Por Giselle Rodrigues
Na era dos vídeos curtos e da atenção fragmentada, a data acende um alerta: Formaremos uma geração incapaz de pensar com profundidade?
No Dia Internacional da Juventude, um alerta silencioso ecoa no mundo digital: o “empobrecimento cerebral” ameaça uma geração inteira. Conhecido como brain rot, esse fenômeno descreve a perda gradual de capacidade de atenção, concentração e pensamento profundo causada pelo consumo excessivo de conteúdos curtos, rápidos e superficiais como os vídeos que se multiplicam em feeds de redes sociais. É um problema que não se limita a um modismo tecnológico: trata-se de uma mudança estrutural na forma como o cérebro jovem processa e retém informações.
No universo de WALL-E, filme da Disney-Pixar de 2008, a temática já era um alerta. A humanidade abandonou a Terra após décadas de consumo desenfreado, poluição e descarte indisciplinado de resíduos. Essa migração espacial não é apenas uma fuga do planeta degradado, mas também o início de uma transformação profunda no modo de vida humano. Instalados na nave Axiom, os seres humanos viviam uma existência completamente sedentária, passiva e dominada por telas em uma imagem que funciona como uma crítica contundente aos hábitos contemporâneos.
Ao longo do filme, fica claro que a vida dos passageiros da Axiom é marcada pela alienação. Eles se moviam em cadeiras flutuantes, com pouco ou nenhum contato físico e social real e suas atenções eram totalmente capturadas por dispositivos tecnológicos. Essa representação simboliza o risco do brain rot e da desumanização: a tecnologia, que deveria ser ferramenta de empoderamento e conexão, tornou-se um substituto da experiência concreta, um anestésico para a apatia e a desconexão emocional.
Estudos recentes mostram que, quando exposto continuamente a estímulos imediatos e recompensas instantâneas, o cérebro passa a exigir esse padrão em todas as atividades. O resultado? Leituras longas, conversas profundas ou tarefas acadêmicas complexas tornam-se cada vez mais desafiadoras. E embora esse efeito possa atingir qualquer faixa etária, adolescentes e jovens adultos estão na linha de frente do risco — justamente porque essa é a fase de maior plasticidade cerebral e formação de habilidades cognitivas duradouras.
O paradoxo é que a mesma juventude que enfrenta o brain rot também é a mais capacitada para transformar esse cenário. O acesso a ferramentas de aprendizado global, oportunidades de expressão artística e canais de mobilização social nunca foi tão amplo. No entanto, para que essas potencialidades floresçam, é preciso equilíbrio: limitar a dieta mental composta apenas por estímulos rápidos e reintroduzir atividades que demandem foco, paciência e reflexão.
O impacto do empobrecimento cerebral não se restringe ao desempenho escolar ou profissional; ele molda a própria visão de mundo. Quando a mente se acostuma a fragmentos, perde-se a capacidade de conectar ideias, de pensar criticamente e de sustentar debates construtivos. Em tempos de polarização e excesso de informação, essa habilidade é mais que uma virtude, é uma necessidade para a democracia, a ciência e o progresso social.
O Dia Internacional da Juventude não deve ser apenas uma celebração, mas um compromisso. Governos, escolas, famílias e os próprios jovens precisam assumir a responsabilidade de criar ambientes físicos e digitais que estimulem a atenção plena, a leitura profunda, a prática esportiva, a arte e a interação presencial. Pequenas mudanças diárias, como trocar minutos de rolagem automática por momentos de reflexão ou aprendizado concentrado, podem reverter danos e fortalecer o pensamento crítico.
Em última análise, o brain rot é um sintoma de um tempo acelerado e saturado de estímulos. Mas, assim como o cérebro pode se adaptar a hábitos superficiais, também pode se reprogramar para buscar profundidade e sentido. No Dia Internacional da Juventude, a mensagem é clara: proteger a saúde mental e cognitiva dessa geração é proteger o próprio futuro. Porque uma juventude com atenção plena e pensamento crítico não apenas consome o mundo, ela o transforma.