Por muito tempo, o artista baiano Sérgio Soarez, 56 anos, caminhou entre o invisível e o esquecimento. Filho de um marceneiro e de uma artesã, cresceu em Salvador cercado pelo trabalho manual, pela madeira, pelo ferro e pela força de suas raízes. Aos 17 anos, encontrou na arte o espaço para se expressar, mas também para resistir — e resistir, para ele, sempre significou existir.
Agora, depois de mais de três décadas de criação, sua trajetória finalmente ocupa o espaço que merece: Sérgio é um dos nomes confirmados na Bienal de São Paulo, uma das maiores mostras de arte do mundo, que será aberta em setembro.
O reconhecimento não veio por acaso. Para o curador camaronês Bonaventure Soh Bejeng Ndikung, responsável pela edição deste ano, a presença de Sérgio era inegociável. “Ele traduz emoções em objetos como poucos artistas conseguem. Pessoas como ele fazem seu trabalho não para o agora, mas para a posteridade”, afirmou.
Suas esculturas misturam madeira e ferro, materiais que carregam significados ancestrais e espirituais. Nos cortes e dobras, ele encontra equilíbrio entre forças opostas: o leve e o pesado, o rígido e o maleável, o sagrado e o cotidiano. Sua arte nasce da herança africana, da ligação com Oxóssi e Ogum, mas também da sensibilidade de quem transforma dor em beleza.
A caminhada, porém, foi dura. Sem acesso a galerias ou apoios, Sérgio enfrentou portas fechadas e preconceitos. Em São Paulo, chegou a morar em um terreno baldio por três meses, tentando se inserir em um sistema de arte que, historicamente, exclui corpos negros. Ainda assim, nunca parou de criar.
“Se eu não esperar, não me decepciono. Essa foi a estratégia que encontrei com o tempo de exclusão”, diz ele, com a serenidade de quem aprendeu a transformar silêncio em escultura.
Agora, ao lado de nomes consagrados como Abdias Nascimento, Rubem Valentim e Emanoel Araujo, Sérgio ocupa o lugar que sempre lhe pertenceu: o da representatividade, da continuidade e do legado. São cerca de 60 peças já produzidas ao longo da carreira, 18 delas na Bienal. E mais: uma nova exposição individual, em gestação há quase uma década, que promete mergulhar ainda mais fundo nas raízes africanas que sustentam sua obra.
Para muitos, sua participação na Bienal é uma vitória pessoal. Mas, para além disso, é também um símbolo de transformação: a prova de que artistas negros não apenas resistem, mas conquistam, crescem e escrevem novas narrativas na história da arte brasileira.
A Bienal de São Paulo acontece de 6 de setembro de 2025 a 11 de janeiro de 2026. E este ano, a força criativa de Sérgio Soarez mostra que a arte negra não é exceção, mas protagonista.