Por Leticia Sotero
Empreender já é, por si só, um grande desafio e, sendo mulher negra, esse desafio ganha outras camadas: o cansaço da resistência, a sobrecarga emocional e o sentimento constante de que é preciso provar valor o tempo todo. É o peso de carregar, sozinha, a responsabilidade de construir algo num país que ainda coloca tantas barreiras no caminho das mulheres negras.
A escritora e pesquisadora Ana Cláudia Pacheco nos lembra, em seus estudos sobre a solidão da mulher negra, que essa solidão não é apenas afetiva, ela também é social e estrutural. Somos atravessadas por uma ausência histórica de apoio, de reconhecimento e de redes de confiança. Esse vazio aparece também no mundo dos negócios, quando empreendemos sem ter com quem dividir as decisões, as dúvidas e até as pequenas vitórias.
O empreendedorismo feminino negro no Brasil cresceu de forma expressiva nos últimos anos. Segundo dados do Sebrae e do Instituto Locomotiva, as mulheres negras já representam mais de 48% das empreendedoras do país, muitas vezes movidas pela necessidade de gerar renda em meio à falta de oportunidades formais. Mas o que os números não mostram é o quanto essa jornada pode ser solitária. Por trás das vitrines bonitas e dos sorrisos em rede social, existe uma rotina de sobrecarga, insegurança e autocobrança.
É nesse ponto que as parcerias fazem toda a diferença. Ter alguém para caminhar junto não é apenas um gesto de afeto, é uma estratégia de sobrevivência. E parceria, aqui, não se limita a contratos ou lucros. Às vezes, é uma mentora que te orienta em um momento de dúvida, uma amiga que escuta sem julgamento, ou alguém da sua rede que te indica uma oportunidade. São vínculos que sustentam quando o emocional ameaça ruir. Nem toda parceria precisa gerar retorno financeiro. Algumas trazem aprendizado, outras fortalecem a confiança, e muitas ensinam o valor do coletivo. É claro que é importante avaliar o quanto estamos dispostas a abrir mão, o que oferecemos e o que esperamos em troca, mas não podemos ignorar que a jornada empreendedora é feita também de afetos.
Ter uma amiga para dividir as dores já é um respiro, mas é essencial também ter alguém que possa ser suporte quando o cansaço bate, alguém que te lembre por que você começou. Porque, no corre de quem empreende, a solidão é traiçoeira: ela se disfarça de produtividade, de independência, de “dar conta de tudo”. E quando percebemos, já estamos esgotadas. A verdade é que estar o tempo todo “performando simpatia”, sorrindo, mantendo o discurso de sucesso, escondendo as falhas… é cansativo. Por isso, dividir os bônus e os ônus com alguém é o que torna o empreender mais leve e verdadeiro. É entender que sucesso também é saber pedir ajuda, saber pausar, saber dividir.
Como empreendedora, aprendi que parcerias não nascem apenas de interesses, mas de trocas sinceras. E que acolher uma amiga, um colega, uma parceira em um momento de vulnerabilidade é tão importante quanto ser acolhida. O empreendedorismo pode ser solitário, mas não precisa ser isolado. Quando abrimos espaço para a colaboração, o caminho deixa de ser sobre resistência e passa a ser sobre construção.
Parceria é maturidade e também cuidado. É rir junto das falhas, celebrar as pequenas conquistas e entender que empreender não é sobre heroísmo, mas sobre humanidade. Quando mulheres negras se unem para construir, trocar e crescer, o que antes era solidão vira rede, e o que antes era peso se transforma em potência.
Empreender em coletivo é romper com o mito da mulher negra incansável. É afirmar que precisamos e merecemos apoio. Porque resistir nos mantém de pé, mas é em rede que aprendemos a florescer.
Essa publicação é fruto de uma parceria especial entre a Revista Raça Brasil e o Fórum Brasil Diverso, evento realizado pela Revista Raça Brasil nos dias 10 e 11 de novembro, que celebra a diversidade, a cultura e a potência da música negra brasileira. Não perca a oportunidade de participar desse encontro transformador — inscreva-se já http://www.forumbrasildiverso.org