Penso na interpenetração das agendas do mundo do trabalho. Nos ardis, artimanhas e se a palavra couber, na crueldade do capitalismo, sempre pronto a levar a exploração dos trabalhadores a limites extremos. No esforço de encontrar pontos de unidade no movimento sindical, associativo, no próprio movimento negro, creio ser fundamental a luta contra o trabalho infantil, a alcançar campo e cidade. Tentemos nos entender quanto a isso, e o quanto ela interessa à luta antirracista.
No ano de 2024, o trabalho infantil cresceu 7,3% no Nordeste, segundo o IBGE. No restante do País, o crescimento foi de 2,1%. Ao todo isso significa a existência de mais de um milhão e seiscentos mil crianças e adolescentes trabalhando no País. O Nordeste experimentou o segundo maior crescimento, superado, e de modo aparentemente surpreendente, pela região Sul. O Nordeste foi a região de maior redução do indicador, queda de 27,1% desde 2016.
Assim, é preocupante o crescimento de mais de 7% de crianças e adolescentes mergulhados no mundo do trabalho na região em 2024. Os dados do IBGE indicam: mais de metade da população entre 5 e 17 anos está envolvida em trabalhos domésticos ou tarefas de cuidados das pessoas.
Não é discussão fácil. Comum encontrar posições favoráveis ao trabalho infantil na sociedade. Pais e mães costumam defendê-lo: seja por acréscimo de renda, seja, também, por acompanhar a linha do “trabalho educa”, bem de acordo com a cultura capitalista.
Para muitos, não chegaram ainda as lições e determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente, a situar esse período da vida como de aprendizado, de estudo, preparação para a chegada ao mundo adulto, quando, e só então, caberia o ingresso no mundo do trabalho.
Não se queira demonizar pais e mães. Melhor buscar meios de educá-los, levá-los a uma nova compreensão. O capital está sempre disposto a contrariar as leis, e crianças são envolvidas até no trabalho escravo. Não é preciso muito esforço para perceber o impacto negativo do trabalho infantil. Menor presença na escola, uma delas.
Entre a população infantil envolvida com o mundo do trabalho, dos 5 aos 17 anos, 88,8% estavam estudando enquanto a taxa da população geral na mesma faixa etária é de 97,5%. Crianças e adolescentes, ao trabalhar, têm muito mais dificuldades no estudo, pois a eles sobra muito pouco tempo para a chamada lição de casa. E com isso, com precário rendimento escolar, terá enormes dificuldades para romper o círculo da pobreza. E a chegada precoce ao trabalho leva a muitos acidentes. Os dados do IBGE informam a ocorrência de 15 acidentes de trabalho por dia com crianças e adolescentes em 2024.
Movimento negro: se falamos do Nordeste, é região com mais 70% de pretos e pardos. Se falamos da Bahia, quase 80%. Com isso, as principais vítimas do trabalho infantil estão entre as crianças pretas e pardas. Ressaltar isso não significa eliminar as outras crianças e adolescentes atingidas, mas demonstrar os obstáculos surgidos para os filhos das famílias negras. A boa notícia: no mês de outubro, na Bahia, deve ocorrer uma ampla operação contra o trabalho infantil no Estado, a chegar a 50 pontos de indício dessa prática.
No Nordeste, essa luta ganha dimensão especial por ser uma população majoritariamente preta e parda. Jogada precocemente no trabalho, é condenada a não escapar do círculo da pobreza. De uma forma ou de outra, é o racismo naturalizado, quase uma fatalidade permanecer nas condições em que nasceu.
Ao Estado brasileiro, cabe prosseguir com políticas públicas afirmativas, de variada natureza, destinadas a avançar na constituição de uma sociedade solidária, fraterna, a não permitir a permanência dos ecos da Casa Grande, ainda ouvidos em tantos cantos do País.
A pauta do combate ao trabalho infantil é fortemente antirracista, e interessa a toda a classe trabalhadora. Criança e adolescente, nesse período da vida, devem estudar, avançar no conhecimento do mundo, desfrutar dessa fase, ganhar consistência para chegar em boas condições ao mundo adulto. E isso importa, de modo muito especial, à população negra.
Essa publicação é fruto de uma parceria especial entre a Revista Raça Brasil e o Fórum Brasil Diverso, evento realizado pela Revista Raça Brasil nos dias 10 e 11 de novembro, que celebra a diversidade, a cultura e a potência da música negra brasileira. Não perca a oportunidade de participar desse encontro transformador — inscreva-se já http://www.forumbrasildiverso.org







