A Beleza do Dia da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha.

Celebramos o dia 25 de julho como um registro das desigualdades que marcam a nossa trajetória de vida. No meu campo de atuação, tenho proposto uma reflexão sobre o modo como a nossa aparência importa. Ser negra, branca, indígena ou oriental, para além de todos os componentes étnicos e de socialização é, de modo imediato, como nos parecemos em dado contexto e em meio aos modos de interpretação da nossa visualidade, os quais são mediados pelas relações de poder que compõem a estrutura social brasileira.

Aparência nesse conjunto é o que mais importa! São características materiais como cor da pele, formato de nariz e boca, cor do olhos, silhueta, tipo e estilo de cabelo – se uso ele processado, natural, com dreadlocks ou megahair – o que nos localiza na hierarquia das relações sociais, repercutindo inclusive na nossa expectativa de vida. Pensando num fenômeno antigo que é a feminização da pobreza, a qual numericamente demonstra que as pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza são majoritariamente mulheres negras, observo que o colorismo traduz e reforça a ideia de que quanto mais preta retinta se é, mais pobre se parece.

Sou mulher negra de pele clara, filha de mãe negra de pele preta e de pai socialmente visto como branco. Em cada lugar que transito recebo um tratamento diferente, mas que é recorrente. Se acompanhada de meu pai, sou a puta, pois estou com um homem branco, mais velho e de olhos claros; se acompanhada de minha mãe somos avaliadas por quanto dinheiro provavelmente não temos e se saio com meu tio – cujo tom de pele é ainda mais retinto que o de minha mãe – sou vista com desconfiança. Dentre muitas amigas brancas e queridas que tenho, se carrego o filho de uma delas, não recebo o cumprimento das pessoas pois sou apenas a babá da criança, ou seja, aquele corpo servil que inexiste socialmente já que sua característica é apenas funcional!

Quando relato esses fatos em entrevistas ou salas de aula por onde passo, as pessoas perguntam: – Mas, até vc? E devolvo: Sou apenas mais um corpo negro andando por aí. O que sou e o que faço não são visíveis aos olhos do racismo!

Numa palestra recente relatei que residi em Santo Amaro da Purificação – BA até os 19 anos, quando mudei para Feira de Santana por conta da universidade, mas que ao me deslocar para Salvador em 2005 foi quando passei a colecionar as experiências mais graves e materializadas de racismo.

Por conta do meu trabalho como artista, já transitei por alguns países em África, Europa e América do Norte, especialmente nesses dois últimos as atitudes racistas foram bem fortes, mas foram interferências transitórias, pois não estão presentes no meu cotidiano haja vista que moro em Salvador, na Bahia, Brasil: cidade que compõe a maior população negra fora do continente africano, mas onde ainda habitamos lugares subalternizados.

Por outro lado, no campo da moda e da estética, são as mulheres negras dessa cidade, as responsáveis por uma mudança incrível na paisagem humana. Turbantes, cabelos com muito volume, tranças coloridas, roupas referenciadas na moda afro-brasileira, são elementos visíveis que nos ajudam a declarar que não tem mais volta! Passamos, sim, a existir da maneira como o nosso legado cultural de resistência nos inspira, para não somente materializar a nossa criatividade nos nossos corpos, mas especialmente como empreendedoras constituindo o gerenciamento de marcas de moda, design, acessórios, dentre outros segmentos de produtos e serviços, redesenhando também as nossas habitações, produções intelectuais, artísticas e culturais. E assim estamos juntas, construindo outro tempo!

 

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Mulher Negra, Feminista e como Designer de Moda Autoral elabora produtos e imagens de moda a partir de reflexões sobre as relações étnico-raciais e de gênero. Professora Adjunta do Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade - FFCH – UFBA e Doutoranda no Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade – IHAC – UFBA, pesquisa a relação entre Moda e Ativismo Político

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