Muito além de um acessório de estilo, a boina tem se transformado em símbolo de pertencimento, ancestralidade e afirmação para a comunidade negra no Brasil. O item, que já foi ligado a militares, intelectuais e revolucionários, ganha hoje uma nova narrativa: a de resistência estética e cultural.
Ela voltou aos holofotes com força — impulsionada por desfiles de alta-costura como os de Paris Outono/Inverno 2025/26 —, mas sua presença mais potente talvez não esteja nas passarelas, e sim nas cabeças de quem escolhe vestir história e identidade todos os dias. Artistas como Cardi B, Tems e nomes nacionais como Jorge Aragão e Djavan são apenas alguns entre muitos que transformam a boina em expressão viva de orgulho e negritude.
No Brasil, ela chega em versões mais leves e adaptadas ao clima, como algodão, mas carrega o mesmo peso simbólico. Muito mais do que tendência, ela representa um gesto: um reencontro com o espelho e com as próprias raízes.
Denis Linhares, proprietário de uma chapelaria tradicional no Rio de Janeiro, confirma: “a boina voltou com força porque as pessoas estão procurando acessórios que contam histórias. E no caso da comunidade negra, ela fala de resistência e estilo com profundidade”.
Com raízes no século XIX, a boina atravessou os séculos vestindo nomes como Coco Chanel, Picasso e Che Guevara, mas foi com o Partido dos Panteras Negras nos Estados Unidos que ela assumiu de vez sua potência política. No Brasil atual, ela ressurge como símbolo de visibilidade e reconhecimento.
O ator Lorre Motta, que adotou recentemente a boina como parte do seu visual, fala sobre como o acessório se conecta com a experiência de corpos negros: “é uma proteção simbólica. Quando você tem cabelo crespo, muitas vezes cresce aprendendo a esconder. A boina, pra mim, é uma escolha de mostrar”.
Brunno Almeida Maia, pesquisador em teoria da moda, reforça que a apropriação da boina por pessoas negras produz um deslocamento de sentido: “ela deixa de ser só estética e se torna política, memória e orgulho”.
Neste novo ciclo, a boina já não é apenas moda — é uma mensagem. Em cada curva de tecido, carrega a luta de quem precisou afirmar que o corpo negro é belo, digno e cheio de histórias. E por isso, hoje, vê-la nas ruas é também enxergar a beleza da resistência silenciosa.