Ao entrar no Centro de Memória da Faculdade de Letras da UFMG, o visitante é acolhido por uma presença que vai além das imagens e palavras. É como se vozes antigas – de mulheres, homens, famílias inteiras – sussurrassem histórias que não couberam nos livros de História. É disso que se trata a mostra “Cumbara”, aberta até o dia 25 de junho: um reencontro com aquilo que nunca deveria ter sido esquecido.
“Cumbara”, palavra de origem banto que significa “cidade”, leva o público a percorrer os caminhos de sete quilombos formados por negros livres no século 18, além de apresentar 11 comunidades que até hoje preservam a língua, os ritos e os saberes trazidos da África por aqueles que, mesmo arrancados de sua terra, nunca perderam a dignidade e a coragem de (re)construir um lar.
Idealizada pela professora, poeta e pesquisadora Sônia Queiroz, a mostra é um gesto de afeto, resistência e justiça histórica. Os textos foram escritos na Língua do Negro da Costa, um dialeto falado por jovens da comunidade de Tabatinga, em Bom Despacho (MG), e que sobrevive em festas, rodas de conversa e bares, longe da escola, mas perto do coração de quem aprendeu com os mais velhos — e com os amigos.
As imagens, assinadas por artistas como Murilo Pagani e retiradas de manuscritos históricos do século 18, se misturam com desenhos aquarelados e um mapa que localiza os agrupamentos ainda vivos. Neles, pulsa uma fé sincrética e uma cultura rica: vissungos, reinados, o candombe e outras expressões de um povo que canta até nas despedidas.
Uma história que segue viva
Visitar “Cumbara” não é apenas aprender sobre o passado. É se deixar tocar por ele. É perceber que a liberdade, para o povo negro, nunca foi dada — foi construída, passo a passo, em meio ao barro, ao canto, à dança e à dor. É enxergar que há territórios de resistência onde antes se contava apenas submissão.
É também reconhecer que ainda temos muito a ouvir, a reparar, a preservar. Em tempos de tantas vozes abafadas, a mostra nos lembra que há histórias que só sobrevivem se formos capazes de escutar com atenção, respeito e empatia.
“Cumbara” é uma chance de fazer isso. E talvez, de aprender a ver o Brasil com outros olhos.
Mostra Cumbara
Local: Centro de Memória da Faculdade de Letras (Fale), campus Pampulha
Quando: de 26 de maio a 25 de junho
Horário: Segunda a sexta, das 15h às 19h
Entrada gratuita