A transformação social mora a quatro passos de você  

*Fábio Pereira 

O caminho da felicidade 

ainda existe. 

É uma trilha estreita em meio

à selva triste. 

(Racionais MC’s) 

Diversos poetas periféricos expressaram a frustração diante das injustiças e aproveito para celebrar a iniciativa de todos em prol de um mundo mais igualitário. O psicólogo e mediador de conflitos Marshall Rosenberg tinha uma metáfora interessante para falar sobre transformação social.

Imagine que uma pessoa está andando na beira de um rio enquanto contempla o brilho do sol sob as águas. Eis que, de repente, ela avista um bebê num cesto, sendo levado a esmo pela correnteza violenta. 

Sem nem pensar duas vezes a pessoa se atira em direção à criança, nada até ela e a agarra firme, levando-a em segurança para a terra. Ocorre que, mal tendo saído da água, ainda arfante pelo resgate, a pessoa repara que outro cesto surge. Novo mergulho e, para seu desalento, se depara com dois novos rebentos flutuando perigosamente. 

Diante dessa sucessão de fatos, ela grita por ajuda, ao que prontamente é atendida por outra pessoa que por ali passava. Agora são duas forças se dedicando aos salvamentos, mas o que ocorre é que os cestos com crianças se multiplicam a ponto de já não ser possível salvar a todas. O problema tomou uma dimensão maior do que a capacidade de transformá-lo. 

Eis que uma das pessoas envolvidas resolve mudar a estratégia. Ela decide subir pela orla, contra o fluxo da corrente. Seu intuito é ir na raiz do problema e entender de onde vêm tantos bebês a fim evitar que eles caiam na água. Ponto.

Neste momento da perturbadora estória, Rosenberg explica que estamos mais próximos da transformação social tão esperada, pois começamos a buscar as causas do sofrimento. Segundo ele, a Comunicação Não-Violenta (CNV) é sobre isto: desvendar a origem dos nossos problemas e convertê-los. 

Para mudar essa cultura de violência na base, a CNV propõe quatro passos para resolver as mazelas sociais, que são fruto de relações conflituosas em contínua espiral, aumentando sem parar. A obraComunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais define esses passos. Vamos a eles, de modo bem resumido:

Primeiro passo: observar sem avaliar. “Quando combinamos observações com avaliações, os outros tendem a receber isso como crítica e resistir ao que dizemos (…)

 Em vez disso, as observações devem ser feitas de modo específico (…). Por exemplo, ‘Zequinha não marcou nenhum gol em vinte partidas’, em vez de ‘Zequinha é péssimo jogador de futebol’”, ensina Rosenberg. 

Segundo passo: saber o que está sentindo. “Desenvolver um vocabulário de sentimentos que nos permita nomear ou identificar de forma clara e específica nossas emoções nos conecta mais facilmente uns com os outros. Ao nos permitirmos ser vulneráveis por expressarmos nossos sentimentos, ajudamos a resolver conflitos”.

Terceiro passo: mirar as necessidades. “Num mundo onde com frequência somos julgados severamente por identificarmos e revelarmos nossas necessidades, fazer isso pode ser muito assustador, especialmente para as mulheres, que são ensinadas socialmente a ignorar as próprias necessidades para cuidar dos outros”. São exemplos de necessidades: segurança, autonomia e compreensão. 

Por fim, quarto passo: fazer um pedido. “Quanto mais claros formos a respeito do que desejamos obter como retorno, mais provável será que o consigamos (….). Especialmente ao nos expressarmos para um grupo, precisamos ser claros quanto à natureza da resposta que desejamos obter. Pedidos são percebidos como exigências quando os ouvintes acreditam que serão culpados ou punidos se não os atenderem”.

Ao longo dos mais de 40 anos em que praticou e ensinou CNV, Rosenberg ajudou diversos grupos sociais a conquistarem suas demandas junto às autoridades. E em que pese a busca por compreender o outro, a CNV não propõe permissividade. Se um caminho de transformação não desse certo, o psicólogo insistia que outra estratégia poderia ser tentada. Só nos lembrava que a CNV não pretendia substituir a violência com mais violência. 

Por isso, afirmou: “o objetivo da CNV não é mudar as pessoas e seu comportamento para conseguir o que queremos, mas, sim, estabelecer relacionamentos baseados em honestidade e empatia, que acabarão atendendo às necessidades de todos”.

Que possamos renovar nossas esperanças em meio à selva de cada dia. Salve, Racionais!

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