Adriana Alves E Olivier sorte no amor e nos negócios

Por: Maurício Pestana

Em conversa franca, Adriana Alves mostrou sua visão sobre negócios , pandemia , relacionamento e contou detalhes de sua história como empresária. Ela contou também sobre sua relação de 14 anos com o Chef Olivier Anquier  . 

A atriz paulistana já interpretou diversos personagens na teledramaturgia e no cinema, começou a carreira como modelo aos 17 anos e estreou no teatro na peça O Sorriso do Palhaço, em 1998. Participou de produções na televisão como o seriado Turma do Gueto, da TV Record, atuou em novelas da TV Globo, como Celebridade, Como Uma Onda e Duas Caras. Já no SBT ela viveu a personagem Paula Rivera, na novela infantil Carrossel. Além de ter atuado em filmes como O Último Voo do Flamingo, gravado em Moçambique com direção de João Ribeiro.

Hoje com 44 anos, encontrou nos negócios seu propósito profissional. Empreendedora desde a adolescência, Adriana Alves administra os negócios do marido, o chef Olivier Anquier, e revelou à Raça sua aptidão para gerir equipes.

As pessoas a conhecem pelos trabalhos realizados no meio artístico e depois você deu uma guinada à frente dos negócios. Como aconteceu a mudança da carreira de atriz para a carreira empresarial?

Foi uma surpresa, porque eu nunca imaginei que pudesse ter duas profissões. Na verdade, como artista se tem várias profissões dentro de uma só, mas quando se torna empresário e administrador você entende que o mundo é regido de maneira diferente do mundo das artes. Então, tem que lidar diretamente com funcionários, com fornecedores, com a contabilidade e advogados. Era um mundo com que eu não tinha tanta proximidade, mas com o qual aprendi a lidar.

Tudo é muito interessante, mas a burocracia é a pior parte porque quando você tem que lidar com dinheiro, quando precisa dirigir algo e decidir o que é melhor para a vida de uma pessoa, enquanto essa pessoa é seu funcionário, é preciso ter uma relação mais saudável, principalmente pensando que um dia essa pessoa pode ficar com você e no outro dia ela não fará mais parte da equipe por qualquer motivo. Para mim, essa é uma tarefa bem difícil, lidar com o fornecedor também. Nós trabalhamos com perecíveis e meu marido sempre trabalhou com restaurante e cozinha, eu administrei durante muito tempo a nossa padaria e hoje ela não existe mais. Nós temos uma marca própria que é do Olivier, mas infelizmente ficou impossível manter a loja física, algo que não aconteceu só com a gente, mas com muitos outros negócios.

Historicamente pessoas negras nunca foram donas dos próprios negócios, como as pessoas brancas que geralmente herdam dos seus pais. Você tinha alguma experiência com comércio ou alguém da sua família tinha?

Vou contar uma história que eu acho que nunca disse para ninguém, não porque não quisesse contar, mas talvez porque ninguém me fez essa pergunta antes. Quando eu tinha 16 anos estava voltando do colégio e ouvi dentro do ônibus duas garotas falando que não havia nada que o brasileiro não gostasse mais que brigadeiro, na hora pensei:

“Cara, vou fazer brigadeiro e vou vender na escola porque que eu queria ir ao show do Jorge Ben Jor”.

Ele era um fenômeno naquela época e eu gostava muito, minha mãe não podia pagar o ingresso então eu fiz um bandejão de brigadeiros e comecei a vender, transformei-me em uma pequena empreendedora dentro de uma área que eu conhecia bem, que era comer brigadeiro (risos), mas até então eu não vendia e foi um sucesso. Logo na primeira semana que comecei a vender os doces na escola. Meu pequeno negócio deu certo até o dono da cantina descobrir que eu estava vendendo doce dentro da sala de aula e acabar com meu sonho. Mas foi aí que entendi que eu tinha um tato para os negócios. Eu gostava de fazer doce, sou neta de baiana, minha avó era cozinheira. Então a gente fazia coisas desde sempre em casa.

Comecei esse pequeno negócio aos 16 anos, depois fiz bicos, várias coisas, mas continuei meu negócio com comida. Foi muito engraçado, mudei de escola e na escola nova não tinha cantina, então comecei a vender sanduíche natural. Eu sempre tinha alguma coisa, mesmo sem fazer propaganda, não porque tivesse vergonha, nada disso, mas porque era algo que eu fazia com prazer, porque gostava e as pessoas ficavam felizes porque também consumiam algo num momento importante; na hora do intervalo você tem muita fome principalmente à noite, então eu sempre tive esse lado, mas ele ficou quietinho porque eu sempre tive muitas profissões.

Eu sempre estudei, sempre fui atrás das minhas coisas, consegui ajudar minha mãe e minha família com uma graninha extra que ganhava. Agora, anos e anos depois, veio a ideia de ser uma empreendedora porque no nosso negócio familiar era importante que eu também desse continuidade a algo que fizesse parte da nossa vida. Então, casada com o Olivier, ele falou: “Você administra a padaria, eu acho que você tem tudo a ver, você pode fazer isso e é algo que pode dominar”. E o motivo dele ter certeza disso é bem inusitado. 

Poucas pessoas sabem, mas eu sou síndica do meu condomínio, até quando eu não sei, mas ainda sou, então eu tenho facilidade de lidar com as pessoas. As pessoas chegam com um problema imenso e pensam somente em si e é importante que elas saibam que quando se vive numa pequena sociedade, como um condomínio, não importa quantas torres ele tenha, não importa quantos apartamentos tem em um andar, você precisa conviver com outras pessoas, você não decide as coisas sozinho e eu conseguia encontrar uma forma de fazer com que as pessoas entendessem e aceitassem. Nem todos ficam muito contentes, mas as pessoas entendem que aquela é a melhor forma da gente chegar a um consenso.

Então essa facilidade que eu encontrava para gerenciar o condomínio fez com que ele também me visse como uma empresária. Ele falou: “Você tem certeza? Então vamos lá”.

Eu sempre consegui lidar com isso, então imagina, com 16 anos eu comecei sendo uma pequeniníssima empreendedora, sem pretensão nenhuma. E o melhor é que com essa idade eu consegui comprar ingresso e roupa nova para o show do Ben Jor e pude conhecê-lo. Adoro o Ben Jor. Sou fã.

Pelo que você fala, o Olivier teve uma presença , uma função muito grande nesse processo de impulsioná-la como empreendedora. Conte-nos um pouco sobre o incentivo dele.

Quando eu conheci o Olivier ele tinha três fuscas que colecionava e eu não entendia por que três, era o verde, que todo mundo conhece por causa do programa [Diário do Olivier transmitido pelo canal GNT], um azul e um cinza. Ele usava os três fuscas e eu também usava, ele achava o máximo e eu morria de medo de bater.

Ele tinha outro carro também, um Passat que era conhecido como princesa da estrada. E eu andava com esse carro porque ele me emprestava, eu achava muito engraçado porque eu tinha o meu carro, mas eu deixava guardado e pegava o dele emprestado e ele achava o máximo eu andando nos carros dele, antigos. E normalmente quem coleciona não gosta nem que toque, mas ele sempre foi um cara que acreditou e sempre depositou muita confiança em mim. Nossa relação sempre foi de confiança, de jogo aberto, ele é muito transparente. Então quando ele gosta, quando ele acredita, ele confia e na nossa relação não poderia ser diferente, no mundo dos negócios também aconteceu uma relação de confiança.

Na vida profissional, sempre tive uma relação boa com o pessoal do escritório administrativo e de publicidade que trabalham com ele. As pessoas me ligam para tirar dúvidas, me consultam.

Na padaria nós tínhamos dois apelidos, ele era o “pai” e eu a “mãe”. Trabalhando lá eu tinha que lidar com vários problemas do dia a dia e sempre fiz isso de forma tranquila porque entendo bem a cabeça do ser humano brasileiro. E ele já vem de uma história longa, nascido na França, uma cultura mais rígida, cumpridor dos seus horários, dos seus deveres.

Não que aqui a gente não seja, mas a gente não sabe cumprir horário direito, até hoje eu não aprendi .Com 44 anos, para mim é uma luta, um dia eu vou chegar lá (risos).

Quanto tempo de convivência com o Olivier?

Vamos fazer 14 anos, dia 20 de novembro, aniversário de Zumbi. A gente se conheceu num almoço que teve o troféu Raça Negra. Eu sempre quis ter filha e ele também, então eu entendi que a gente precisava do nosso tempo e a gente estendeu esse tempo por muitos anos (risos) para depois termos nossa filha. A gente não soube se era menino ou menina, quando eu fiquei grávida não quis saber o sexo do bebê, seguramos até o final e quando nasceu foi tudo que imaginamos, parto normal, eu estava tranquila, serena, e o médico levantando o bebê e dizendo “É uma menina”, a gente desabou.

Você foi mãe aos 40 anos?

Aos 40 anos. Me sinto plena e ainda tem mais um monte de coisa para viver, para aprender. A gente agradece por ter Olívia, porque tem momentos de altos e baixos na vida de todo mundo e ela é o nosso grande presente.

Os franceses têm muito amor pelo Brasil. Mas vocês ainda sentem que existem choques culturais, coisas que vocês aprendem juntos, coisas que você estranha?

O tempo todo. Eles não desligam. Ficam concentrados fazendo alguma coisa e não dá para ter piadinha. E a gente tem essa coisa de ser mais leve. O francês é mais rigoroso, gosta de fazer tudo certinho, com início, meio e fim. O Olivier conta que o pai dele dizia: “Porque pagar tão barato naquilo que mais tarde eu vou pagar tão caro”. Porque você paga tão barato se você faz tão mal feito, depois você vai pagar muito mais caro para refazer algo. E ele tem isso, é impressionante, aprendi muito com ele durante anos e ele aprendeu muito comigo porque a gente tem essa troca. Ele é franco-brasileiro, já é naturalizado no Brasil, mas não perde o jeito francês, não tem jeito, é ele.

Vivemos num país em que as relações raciais nunca foram boas. Você já teve problema de estar com o Olivier e entrar em algum lugar que as pessoas fizeram comentários sobre vocês?

Sim, elas não falam diretamente para mim. Mas já aconteceram várias coisas. Logo no começo do namoro, ele nunca tinha vivido isso, fui a primeira namorada depois de anos e hoje somos casados, mas eu me lembro no começo do namoro, quando fomos a um lugar e Olivier encontrou um grupo de conhecidos, ele me apresentou e as pessoas foram indiferentes, não me cumprimentaram. Ele falou: “Essa aqui é fulana e a pessoa olhou e não falou “Oi, prazer, boa noite”, não falou nada, nesse momento eu fiquei quieta e as pessoas continuaram conversando. Ele falou: “O negócio é o seguinte, se vocês não são capazes de cumprimentar minha namorada, eu não tenho que falar com vocês, boa noite” e saiu. Então saímos. Esse só foi um dos momentos que vivemos. Teve outro episódio bem forte, mas também não me abalou porque eu já estava madura; infelizmente todo mundo tem um caso para contar.

Eu não gosto muito de falar porque eu acho que isso não é incentivo, mas é importante as pessoas saberem por que acontece. Uma época íamos muito para Ilhabela, Litoral Norte de São Paulo. Um dia chegamos em um espaço em que era possível passar o dia consumindo coisas. A gente foi almoçar, tomar um drink, alguma coisa e tinha uma senhora do lado, ela me viu entrando com ele e ficou extremamente incomodada e fez um comentário, olhou para mim, levantou e saiu andando. Ali ela declarou que estava incomodada com a minha presença e eu achei ótimo que ela levantou porque o ar ficou mais puro para a gente respirar (risos).

Tenho um pensamento bem claro quanto aos racistas. Desculpem o palavrão, mas que se danem os racistas. Porque os incomodados são eles. Hoje, graças a Deus a gente vive em um mundo em que tem pessoas que têm de tudo, então também tem as pessoas que falam de racismo com propriedade porque viveram aquilo ou porque acham que isso tem que ser alimentado ou porque as pessoas têm que aprender com o racismo e têm que entender que o racismo existe.

Nos EUA é de um jeito, no Brasil é de outro, na França é de outro, cada país tem sua maneira de manifestar aquele que não aceita o negro. Mas o negro tem que ter o pé no chão, tem que ter os quatro dedos abaixo do seu queixo, onde você tem que saber que seu olhar tem que ser direcionado. Você não está olhando nem para cima e nem para baixo, você olha para frente. Aquele que estiver incomodado, dê licença que eu estou passando.

Eu nunca fui retirada de um lugar por ser negra, eu posso não ter sido bem recebida, mas retirada não, porque isso é contra a lei, não importa em qual lugar a gente esteja. Eu acho que o racismo existe, mas existe para várias frentes. Já vi de tudo, já vi crianças racistas me xingarem. É muito triste criança racista.

E como o Olivier lida com isso?

Ele acha que as pessoas que são racistas são pessoas muito infelizes, porque para ele as pessoas que se preocupam com a raça ou cor de uma outra pessoa para fazer a diferença na sua própria vida são pessoas infelizes.

Voltando para a vida durante a pandemia. Como tem sido a convivência em família, está em um período tão complexo?

É um horror o que tá acontecendo no mundo. A gente tem perdido entes queridos, amigos queridos. Há duas semanas eu perdi um amigo fotógrafo, o Máximo Júnior, que foi uma das pessoas mais importantes da minha vida, que fez coisas incríveis e sempre me ajudou, sempre me apoiou. Não só a mim, mas muitas pessoas, isso me entristeceu muito. Não prestar uma homenagem a ele e isso ninguém vai me devolver.

Eu explico para minha filha e ela entende do jeito que a gente explica, ela não tá indo na escola presencialmente e a gente, graças a Deus, conseguiu encontrar outra forma de que ela mantenha a educação dentro de casa, com uma pessoa que nos ajuda. Mas me entristece muito que outras crianças tenham que repetir de ano, que não conseguem estudar, que infelizmente sofram com a violência doméstica.

O que você vê como perspectiva de futuro, acha que vamos ter um novo normal? Como acha que vamos sair desse período?

Eu gostaria muito que isso fosse estudado, que as pessoas pensassem nesse período de pós-pandemia, nesse novo normal. No que é o novo normal. Será que é a gente viver sem máscara? Quando a gente tiver resfriado ainda vai ter a consciência de que tem que colocar máscara? Não sei se no Brasil vamos adquirir esse hábito de respeito ao outro. Eu acho que o Brasil vai passar por cima desse novo normal.

Quando eu falo passar por cima é “vamos sair dessa bem mais pobres do que poderíamos estar”, porque o Brasil é um país muito rico. Infelizmente, nem quero falar nomes, alimentamos muitas diretrizes onde o povo brasileiro perde muito com isso e poderia ter muito mais, mas não ganha. Vamos sair bem mais pobres, não vamos reconhecer lugares que foram fechados e que fizeram parte da nossa história, mas que infelizmente sofreram com a pandemia. 

Existe uma coisa que me preocupa muito que é a doença mental. Tem pessoas que estão psicologicamente abaladas pela doença e não conseguem chegar perto de ninguém, podem estar de máscara e não saem de casa. Elas se transformaram e, provavelmente, não vão conseguir sair dessa situação se não tiverem uma ajuda que de fato faça diferença. Eu espero que encontrem sim a solução para a doença, espero que as pessoas tenham além da vacina para prevenção da Covid-19, que tenham assistência psicológica. Que os nossos governantes, não importa de qual frente política sejam, consigam entender que as vítimas de Covid também precisam passar por tratamento psicológico e que ele seja bom.

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