Mulher atacou dois homens e uma adolescente negra com ofensas em espaço de lazer. Justiça reconheceu a violência e reforçou que “pessoas negras têm direito de estar onde quiserem”
O que era para ser um dia comum de lazer em um clube de Piracicaba (SP) se transformou em um episódio traumático de violência racial. Dois homens e uma adolescente negra foram vítimas de injúria racial, alvo de xingamentos como “negros imundos”, em um ataque que agora foi reconhecido pela Justiça como crime.
Zeni Souto de Barros foi condenada a 2 anos e 4 meses de reclusão pelo episódio, ocorrido em 13 de fevereiro deste ano. A pena foi convertida em prestação de serviços à comunidade, já que ela é ré primária. Apesar da condenação, a acusada continua negando as agressões e afirmou que irá recorrer da decisão.
Segundo o processo, tudo começou quando a mulher jogou água nos dois homens, que estavam na área da piscina. Em seguida, passou a ofendê-los com palavras que carregam séculos de exclusão: “Esse é o meu lugar”, “nojentos”, “negros imundos”. Um diretor do clube tentou intervir, mas também foi insultado. Quando a filha dele, uma adolescente, defendeu o pai, ouviu de Zeni comentários pejorativos sobre sua pele e seu cabelo, reforçando estigmas dolorosos ainda tão presentes.
A Polícia Militar foi acionada e a mulher acabou presa em flagrante. Mesmo diante das provas e dos relatos das vítimas — que sequer conheciam a acusada —, Zeni negou os ataques. Alegou que se tratava de uma “brincadeira de Carnaval” e disse ter sido provocada.
Mas para a juíza Gisela Ruffo, da 4ª Vara Criminal de Piracicaba, os depoimentos foram consistentes. Ela destacou que não havia nenhum motivo que justificasse falsas acusações por parte das vítimas. E foi além, em um trecho contundente da sentença:
“O contexto em que praticadas as ofensas […] reforça o caráter criminoso do ato, como se pessoas de cor de pele preta fossem inferiores e não pudessem ter acesso a espaço qualificado de lazer”.
A fala da magistrada expõe uma ferida ainda aberta na sociedade brasileira: a constante tentativa de expulsar pessoas negras de espaços que deveriam ser de todos. O caso é mais um lembrete de que o racismo não está apenas nos grandes escândalos, mas também — e principalmente — nas violências do dia a dia, nos olhares atravessados, nas palavras duras, nas exclusões silenciosas.
Reconhecer, julgar e punir essas atitudes é um passo importante, não apenas para as vítimas, mas para toda a sociedade. É a lembrança de que justiça também se faz com escuta, acolhimento e responsabilidade.