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Cada pedido é um caminho que escolhemos (ou não) percorrer

Para a Comunicação Não-Violenta (CNV), que é uma técnica aplicada há décadas para gerar conexão e paz entre as pessoas, os pedidos que fazemos aos outros se tornam mais eficazes quando entendemos que eles podem se diversificar sem que a gente abra mão do que deseja. Explico. 

Pedidos são instruções concretas e ativas que damos às pessoas para que nossas necessidades sejam atendidas. É valioso não confundi-los com os nossos próprios desejos. 

Em suma, pedidos são caminhos. Necessidades (ou desejos, no popular) são destinos. É possível chegar em um lugar por vários caminhos diferentes e estes podem ser mais ou menos viáveis de acordo com circunstâncias que por vezes fogem ao nosso controle. Quando não se percebe isso, podemos vir a ter uma inclinação quase irresistível: controlar as atitudes dos outros, o que pode ser bem desgastante e frustrante. Vamos a um exemplo. 

Um homem e uma mulher se casaram e, tão logo consumada a união, trataram de constituir a sua conta bancária conjunta. Em um belo dia, a esposa assinou um cheque com um valor mais alto do que a disponibilidade de dinheiro em conta e o casal contraiu uma dívida difícil de pagar no curto prazo. Os pombinhos tinham completado seis meses de matrimônio e estavam diante do maior desafio de sua vida a dois. 

O esposo agiu prontamente e confiscou o talão da companheira anunciando que, daquele dia em diante, ela estava proibida de gastar o recurso da conta conjunta. Ela não gostou da decisão unilateral. Ele não demonstrou disposição para mudar de estratégia. Estava instalada a crise. 

A descrição da história foi livremente adaptada por este colunista, mas o acontecido é real e quem a narra é o psicólogo Marshall Rosenberg em um de seus treinamentos de CNV. O conteúdo está disponível gratuitamente por conta de uma tradução realizada por Bruno Goulart, do coletivo CNV em Rede

Neste curso, o psicólogo descreve que o casal chegou até ele com uma desconexão tal que produziu conversas parecidas com esta:

Esposo: “Você está querendo nos levar à falência!”.

Esposa: “Você é controlador igualzinho ao seu pai!”.

Ordem em vez de pedido 

O curioso é que quando o casal procura o Dr. Rosenberg já contava com 30 anos de relação sem conseguir solucionar tal conflito. Vamos ao desfecho.

Como Rosenberg agiu? Ensinou cada um a fazer pedidos (ações concretas que propomos aos outros) após apoiar que ambos enxergassem as próprias necessidades e evitassem julgamentos. Nossa cultura nos incentiva a definir quem está certo e quem está errado, num jogo de perde-ganha sem sentido. Assim, com o uso da CNV e diversificando a lógica vigente, o casal passou a conversar mais ou menos assim:

Esposo: “Minha necessidade é de segurança. Gostaria que você me ajudasse a ter certeza de que poderemos garantir a proteção financeira para nossa família. Poderíamos nos reunir uma vez por semana e combinar nossas prioridades financeiras?”.

Esposa: “Minha necessidade é de valorização. Gostaria que você confiasse em mim quando digo que posso aprender a cuidar bem das finanças. Você poderia fazer junto comigo um curso de finanças pessoais para trocarmos ideias sobre nossos gastos?”.

Repare que o pedido é feito na forma de pergunta, pois é uma proposta que pode ser aceita ou não. Fica muito pesado emocionalmente para ambos quando o outro nos atende para evitar punição. Neste caso, não se trata de pedido, mas de uma ordem. E isso complica ainda mais a busca pela conexão que queremos para criar um ambiente de resolução do conflito. Além disso, segundo a experiência de Rosenberg, dá mais resultado pedir o que queremos em vez daquilo que não queremos. 

“Todas as vezes que alguém atende a um pedido motivado por culpa, vergonha, dever, obrigação ou medo de punição, haverá um preço a pagar. Devemos querer que as pessoas atendam aos nossos pedidos somente quando estiverem conectadas com a energia divina que existe dentro delas. Essa energia se manifesta na alegria que sentimos quando fazemos algo por alguém. Não o fazemos para evitar consequências negativas”, afirmou Rosenberg no livro A linguagem da paz em um mundo de conflitos (editora Palas Athena, 2019, p. 63) 

Quando nossas necessidades são atendidas a vida se torna mais maravilhosa, não é mesmo? É para isso que a CNV nos inspira a escolher (e preferir que os outros também escolham) pedidos diversificados, tais como diversos são os caminhos que podem nos levar ao paraíso que tanto almejamos. 

*Fábio Pereira é jornalista, mediador de conflitos e facilitador de Comunicação Não-Violenta (CNV). Integra a ONG CNV em Rede e coordena a Câmara de Mediação Pacific. Instagram: @fabio.dialogos

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Jornalista e mediador extrajudicial com especialização em conflitos familiares e oficinas de parentalidade pelo Instituto Brasileiro de Mediação Familiar. É facilitador de Comunicação Não-Violenta (CNV), colaborando com a ONG CNV em Rede e integrando o banco de facilitadores desta disciplina na Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). É colunista de CNV da Revista Raça.

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