CARAVANA DA UNIÃO DA JUVENTUDE SOCIALISTA – PARTE 3

Confira a última parte da reportagem sobre a caravana “Lutas que construíram o Brasil: da Coluna Prestes à Guerrilha do Araguaia” realizada pela União da Juventude Socialista

 

TEXTO: Rafael Minoro | FOTOS: Léo Souza/A Firma | Adaptação web: David Pereira 

Caravana da União da Juventude Socialista | FOTO: Léo Souza/A Firma

Caravana da União da Juventude Socialista | FOTO: Léo Souza/A Firma

Leia as duas primeiras partes (Parte 1 – Parte 2) da reportagem sobre a caravana da União da Juventude Socialista. Confira o trecho final:

Logo cedo, no dia 19 de abril, os caravaneiros despediram-se de Vila Santa Cruz dos Martírios e rumaram à cidade de São Geraldo do Araguaia. O percurso se deu por meio do famoso pau-de-arara, transporte típico das regiões Norte e Nordeste. Espremidos e empoeirados, sobre tábuas que servem de assento, os jovens conseguiam analisar o bioma da região. Houve uma parada para a vista do Mirante, ponto turístico do Parque Estadual Serra dos Martírios/Andorinhas, local onde o cerrado brasileiro se mistura com a floresta amazônica, revelando-se como uma das regiões mais ricas do país em termos de diversidade biológica e de vestígios arqueológicos. Depois de três horas de viagem, a caravana chegou a São Geraldo do Araguaia, uma cidade com mais de 25 mil habitantes, a 94 km de Eldorado Carajás e vizinha dos municípios de Araguanã e Xambioá. Essa última, inclusive, foi palco escolhido para as atividades do dia. Os estudantes deixaram suas malas na hospedaria e partiram de barco-voadeira para a Praça Manoel Dias, em um trajeto que não demora mais que dez minutos. Lá, sete camponeses que sofreram com o regime militar esperavam os estudantes para uma roda de debate. Foram novas informações que, juntando-se às outras, formam um grande mosaico da ação do valente povo da floresta naqueles tenebrosos dias da ditadura.

Os depoimentos dos três Raimundos, Camilo, Leonardo, Antônio e Darci, camponeses violentados pelas Forças Armadas e que hoje vivem em Xambioá, demonstraram o carinho que a população tinha em relação àqueles guerrilheiros, denominados “paulistas”. Esse carinho não era casual e estava ligado à dedicação e à presteza daqueles jovens em atender à população – cuidando de doenças, fazendo partos, ensinando a ler e escrever, prestando ajuda nos momentos da colheita, dando ânimo nos momentos de maiores dificuldades.

Após a conversa comovente com os camponeses, que ensinam a todos com suas histórias de superação, houve uma discussão com a professora Deusa Maria Sousa, que pesquisa a Guerrilha do Araguaia, com o professor de Xambioá, Paulo Cesar, que já havia participado de um debate em Santa Cruz dos Martírios, e com Fernando Garcia, representante da fundação Maurício Grabois.

O último destino da saga dos jovens socialistas foi Marabá, no sul do Pará. Com as mochilas nas costas, saíram de São Geraldo do Araguaia às 10h e pegaram a estrada: 160 km, três horas de viagem. Chegando à cidade, no dia 20 de abril, puderam acompanhar um debate acerca dos procedentes da Guerrilha do Araguaia com Paulo Fonteles Filho, ativista e historiador;Vandré Fernandes, diretor do documentário “Camponeses do Araguaia: a Guerrilha vista por dentro” e um dos diretores do filme “Onde está Osvaldão?”, ainda em fase de finalização; e Romualdo Pessoa Campos Filho, pesquisador e professor, autor do livro “Esquerda em armas”.

Marabá | FOTO: Léo Souza/A Firma

Marabá | FOTO: Léo Souza/A Firma

É fato que a Guerrilha do Araguaia deixou marcas profundas na alma do povo da região. Acendeu nele a chama da revolta. No final da década de 1970 e durante toda a década de 80, o sul do Pará se tornou palco de uma sangrenta luta entre os posseiros pobres e os latifundiários. Nestes anos, tombaram em defesa da reforma agrária diversos líderes camponeses. “Nos últimos 30 anos, três mil assassinatos ocorreram no Pará, decorrentes da herança da Guerrilha do Araguaia”, avaliou o professor Romualdo. “A presença da repressão pulsa. Todos que sabiam do modus operandi das Forças Armadas foram mortos ou desaparecidos. E isso não faz parte de um passado distante”, completou.

No dia seguinte, os caravaneiros encontraram na praça central da cidade o pessoal do Ministério da Justiça, que completava 83 sessões da caravana da Comissão de Anistia. Após a exibição de um vídeo que contou a história do golpe de 1964 e todas as atrocidades que o procederam, a Comissão de Anistia deu início à avaliação e julgamento de pedidos de indenização de pessoas que tiveram a vida prejudicada pela ditadura militar. O ato ratificou a necessidade da urgente revisão da Lei de Anistia de 1979, a punição severa aos torturadores do regime militar e a abertura de todos os arquivos que existiram durante o período. A vice-presidente da Comissão de Anistia, Sueli Bellato, analisou: “A história que temos hoje está incompleta. Algumas pessoas que escreveram essas páginas as elegeram como a melhor versão que poderia ser contada.Não nos calaremos e exigimos justiça sobre todo esse processo doloroso. Ainda há tempo de contarmos a nossa versão”.

Juntamente com outros cinco conselheiros, a Comissão avaliou sete processos que já tramitavam há anos na justiça. Infelizmente, devido ao feriado e à distância que cada cidade possui, nenhum requerente pôde participar do julgamento. Apenas Agostinho Pereira do Nascimento Filho, que estava representado por sua procuradora, recebeu sua reparação pelas atrocidades cometidas durante o regime militar. Agostinho tinha um comércio nas regiões do rio Araguaia e vendia mantimentos para os guerrilheiros. Os militares o torturaram por oito meses com a premissa de que o comerciante compactuava com a guerrilha. André Tokarski, diante das leituras da Comissão, falou sobre a situação atual dos camponeses.

“Temos buscado refletir os obstáculos que impedem o Brasil de avançar e se realizar plenamente. Na investigação que a caravana proporcionou, percebemos que sem tocar na ferida da transição democrática não andaremos para a frente. É preciso que se conte a história do Araguaia, porque aqui foi palco da maior atrocidade da ditadura militar. O major Curió, por exemplo, que assassinou os guerrilheiros, torturou e matou camponeses, continua impune, ainda com poderes e colocando medo na população dessa região”
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