Localizado no estacionamento da Pupileira, o sítio histórico começa a ser investigado no marco dos 190 anos da Revolta dos Malês
Começaram nesta semana, em Salvador, as escavações em uma área que pode abrigar o maior cemitério de pessoas escravizadas da América Latina. O local, atualmente utilizado como estacionamento da Pupileira — sede da Santa Casa de Misericórdia da Bahia —, começou a ser explorado arqueologicamente na quarta-feira, 14 de maio, data simbólica que marca os 190 anos da Revolta dos Malês, o mais importante levante de africanos islâmicos escravizados ocorrido no Brasil.
A descoberta foi assunto de reportagem no jornal local Correio da Bahia e posteriormente ganhou a grande imprensa.
A identificação do cemitério é resultado da pesquisa de doutorado da arquiteta Silvana Olivieri, desenvolvida na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Segundo os estudos, o local foi usado durante o século XIX para o sepultamento de milhares de africanos escravizados que não resistiram às más condições de transporte e às violências do regime escravocrata logo após sua chegada ao Brasil.
A revelação reforça a necessidade de se preservar e reconhecer sítios arqueológicos relacionados à história da população negra, ainda subvalorizados no debate sobre patrimônio nacional.
Assim como o recém-escavado terreno da Pupileira, outros espaços já revelaram marcas profundas da escravidão no país. Um exemplo emblemático é o Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, reconhecido como Patrimônio Mundial pela UNESCO em 2017. Localizado na zona portuária da capital fluminense, o cais foi a principal porta de entrada de africanos escravizados no continente americano, tendo recebido cerca de um milhão de pessoas traficadas entre os séculos XVIII e XIX. Hoje, o Valongo é um símbolo de memória, resistência e da necessidade de reparação histórica.
As escavações em Salvador devem continuar nas próximas semanas, sob acompanhamento de pesquisadores e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e podem ressignificar a forma como o Brasil encara seu passado escravocrata — não mais como algo periférico, mas como parte central da construção do país.