Cena teatral negra ganha força no Rio

RIo – Seja pela temática, pela produção ou pela encenação, os negros estão vivendo um grande momento na cena teatral carioca. Tanto no palco como na plateia. Como adiantou Ancelmo Gois, em sua coluna, no GLOBO, produções como “Será que vai chover?”, “Favela 2 – a gente não desiste” e a infantil “O Pequeno Prícipe Preto” vem lotando as salas de espetáculo onde estão sendo encenadas, a exemplo de “Luiz Gama: uma voz pela liberdade” e “Contos Negreiros do Brasil”, que já saíram de cartaz por aqui, mas devem voltar ainda este ano.

Segundo produtores e administradores de teatros, as peças estão atraindo um público majoritariamente negro (em algumas, este percentual chega a 85%), mas não só ele.

— Este domingo, 72 pessoas ficaram na fila de espera de “O Pequeno Prícipe Preto”, no Teatro Glauce Rocha, porque os 202 lugares já estavam ocupados. Isso prova o potencial e a busca do público por esse tipo de espetáculo — comemora Cristiano de Oliveira, coordenador de Teatro da Fundação Nacional de Artes (Funarte). — Tanto que vamos prorrogar as apresentações, que seriam encerradas no domingo que vem, até dia 26 de agosto (com exceção dos dias 18 e 19 de agosto).

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A peça conta a história do próprio ator, Júnior Dantas, que, quando criança, queria fazer o personagem de um príncipe na escola, mas foi impedido pela professora por não ser louro e não ter os olhos claros.

Para os adultos, não faltam boas opções também. Um bom exemplo é “Favela 2 — a gente não desiste”, em cartaz do João Caetano, que também acaba de ser prorrogada: terminaria domingo que vem, mas vai até 19 de agosto. Vale lembrar que este teatro conta com cerca de 600 lugares disponíveis (já que os balcões estão fechados). E cada sessão vem atraindo entre 400 e 500 pessoas. Trata-se de uma continuação de “Favela 1”, que estreou no Teatro do Fashion Mall em 2013, e passou cinco anos em cartaz, em salas como as do Teatro Leblon e Baden Powell, além do próprio João Caetano. Dos 21 atores e quatro músicos, apenas seis são brancos.

— Quando estreamos, brincávamos que estávamos levando a favela para invadir um shopping de elite como o Fashion Mall. A temporada, que era para ser de um mês e meio, chegou a três meses – relembra o autor e produtor Rômulo Rodrigues, que usou os mesmos personagens para escrever a continuação. — Naquela época, as UPPs estavam em alta. Mais recentemente, a violência voltou a explodir. Mas nosso foco não é a questão da segurança, e o público se reconhece.

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Sucesso semelhante faz “Contos Negreiros do Brasil”, que estreou em temprada no Sesc Copacabana, há um ano, e agora viaja pelo Brasil (volta ao Rio para uma apresentação no Sesc do Engenho de Dentro no dia 17 de agosto). A peça é baseada no livro homônimo de Marcelino Freire, que lança um olhar sobre a condição real e atual dos negros e negras no Brasil: o jovem estudante, o gay negro, a negra hipersexualizada pela sociedade, o menor infrator, a prostituta, a idosa. Os personagens veem as cenas por meio das estatísticas atuais apresentadas à plateia pelo sociólogo e filósofo Rodrigo França.

Mas, segundo seu produtor, Sérgio Canizio, o elenco já passou por episódios de racismo:

— Numa apresentação, um expectador se levantou em meio a uma cena para perguntar, gritando, se o ator não iria traduzir uma música em yorubá que estava sendo cantada. O ator perguntou se ele fazia o mesmo quando assistia a uma ópera ou via um show internacional, e ele saiu batendo a porta do teatro, reclamando que tinha sido obrigado pela mulher a ver aquela peça de “negros gays”.

Ainda assim, em geral todos festejam este movimento negro nas salas de espetáculo.

— Fizemos duas temporadas de “Luiz Gama: uma voz pela liberdade” no Centro Cultural da Justiça Federal, o que foi muito marcante, não só pelo local, mas porque estreamos no ano passado, por ocasião dos 130 anos da Abolição da Escravatura – conta o produtor Mário Seixas, destacando a importância do personagem, pouco conhecido no Brasil. — Foi a maior bilheteria de lá em 2017. Tanto que nos convidaram para retornar em maio deste ano. O que a direção da casa me disse foi que nunca tinham tido tantos negros prestigiando um espetáculo: cerca de 80% do público era de negros.

SERVIÇO:

‘SERÁ QUE VAI CHOVER?’. Texto: Licínio Januário. Direção: Orlando Caldeira. Com Eli Ferreira, Breno Ferreira, Licínio Januário e outros. A peça apresenta a relação entre uma atriz, um guia turístico e um ativista social, permeada pelo choque de visões sobre as questões sociais, pela amizade e um triângulo amoroso. Teatro Eva Herz (Livraria Cultura): Rua Senador Dantas 45, Centro — 3916-2600. Ter e qua, às 19h. R$ 40. 80 minutos. Não recomendado para menores de 14 anos. Até 25 de julho.

‘FAVELA 2 — A GENTE NÃO DESISTE’. Texto: Rômulo Rodrigues. Direção: Marcio Vieira. Com Vilma Melo, Thiago Justino, Hugo Moura e outros. A comédia musical apresenta histórias inéditas dos personagens do espetáculo “Favela”, que fez temporada na cidade em 2017. Teatro Municipal João Caetano: Praça Tiradentes s/nº, Centro — 2332-9257. Sex e sáb, às 19h30m. Dom, às 18h. R$ 40. 90 minutos. Não recomendado para menores de 14 anos. Até 19 de agosto.

‘O PEQUENO PRÍNCIPE PRETO’. Texto e direção: Rodrigo França. Com Junior Dantas.Um príncipe tem a missão de semear o amor, a diversidade e a empatia nos planetas que visita. Teatro Glauce Rocha: Av. Rio Branco 179, Centro — 2220-0259. Sáb e dom, às 16h. R$ 20. Até 26 de agosto.

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