Com as barbas de molho

Por: Zulu Araújo

Há um ditado popular entre os capoeiristas que diz que é bom “Confiar desconfiando”, sempre.

Funciona como um toque de alerta, do tipo: “nem tudo que reluz é ouro” ou “parece que é mais não é”. Até porque este é o espírito matriz que move e norteia todo e qualquer capoeirista – negacear sempre: aparentar que vai dar uma cabeçada e dar um rabo de arraia fulminante deixando seu oponente atordoado.

Fingir que vai cair de costas e dar uma bela rasteira. Na verdade é o exercício permanente de nunca deixar-se surpreender, de estar sempre atento para o que der e vier.

Este aprendizado, que vem de longe, do tempo em que para se lutar contra o opressor escravocrata, era preciso muito mais do que coragem. Era necessário ter astúcia, habilidade e Inteligência. Isto porque o opressor não tinha dó nem piedade, sentimento ou sensibilidade. Esse era um tempo em que seres humanos eram tratados como mercadoria e suas dores e sofrimento não tinham a menor serventia. Resumindo:

Era o tempo do –“vacilou, morreu.” Pois bem, a meu ver o Brasil anda meio assim. Todo mundo meio irritado sem saber muito bem o porquê. Mas ao menor sinal de contrariedade reage como animal acuado distribuindo patadas para todos os lados e pronto dar o bote que elimine o seu adversário. Foi neste clima que caminhamos para 2019 e os sinais que o mundo da política emitiram não foram nada animadores.

Apesar de termos acabado de passar por um longo e doloroso processo eleitoral, afinal estamos no palanque desde 2016, quando do impeachment da Presidente Dilma, a impressão que temos é de que a eleição ainda não acabou e que algo de inusitado está para acontecer a qualquer momento. A zanga da população foi tamanha e a guinada à direita foi tão radical que nem mesmo os vencedores do pleito estão conseguindo administrar aquilo que conquistou. (Até porque, ninguém governa um país como o Brasil com Fake News e um programa monotemático de combate à corrupção). Pior, o país continua fraturado, dividido e com riscos graves de convulsão social.

Torço e espero, sinceramente, que o país encontre um rumo, que as forças políticas por meio de seus partidos consigam estabelecer um diálogo mínimo que conduza o país para um rumo civilizado, que os direitos sociais duramente conquistados sejam assegurados e consolidados, que a economia volte a crescer, o que temos visto não nos anima muito. São as práticas de sempre, com as desculpas de sempre.

Talvez por isso mesmo, a sociedade tenha que estar mais do que alerta. Em particular a esquerda brasileira. E mais particularmente ainda os segmentos sociais mais vulneráveis de nossa sociedade e dentre esses segmentos a comunidade negra. Visto que, além de sermos historicamente sub- representados em todas as estruturas de poder e vítimas de toda sorte de mazelas, violências e discriminações não há nada de novo no front que indique a superação desse quadro.

Muito pelo contrário.

Daí, o que podemos esperar de melhor é que as lideranças, grupos e movimentos representativos da comunidade negra construam uma agenda mínima propositiva, estabeleçam uma unidade mínima em torno desses pontos, lembrando que esses pontos devem dar conta não só das suas prioridades internas mas apontar para alianças e ações conjuntas com os demais setores da sociedade que estarão em situações análogas. E mais que tudo, que a Democracia e a participação popular devem ser preservadas a qualquer custo.

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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