Na próxima terça-feira (8), a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados promove um debate urgente sobre a criminalização sistemática da cultura negra e periférica no Brasil. Convocada pelos deputados Talíria Petrone (Psol-RJ) e Reimont (PT-RJ), a audiência pública expõe não apenas o racismo enraizado nas instituições, mas questiona até que ponto o Estado brasileiro ainda atua como herdeiro de uma estrutura colonial que persegue, silencia e mata expressões culturais negras.
A perseguição à cultura das periferias não é um fenômeno recente, mas um projeto histórico. Dos tempos em que o samba era criminalizado nos anos 1930 — visto como “coisa de malandro” — até as batidas policiais em bailes funk e as prisões de artistas como MC Poze do Rodo, o padrão se repete: o mesmo sistema que enxerga corpos negros como ameaça trata suas manifestações culturais como caso de polícia.
O recente massacre durante uma festa junina no Morro de Santo Amaro (RJ), onde um jovem foi morto pela polícia, é apenas mais um capítulo dessa narrativa. A justificativa? Sempre a mesma: a associação automática entre pobreza, crime e cultura. Enquanto isso, o mesmo Estado que persegue o funk libera verbas milionárias para eventos elitizados, revelando uma hierarquia cultural que não disfarça seu viés racial.
Sob o discurso de “combate ao crime”, o que se vê é censura pura e simples. Projetos de lei tentam proibir o funk, operações policiais interrompem eventos culturais, e artistas periféricos são criminalizados sob acusações vagas de “apologia ao crime”. A pergunta que fica é: por que a polícia não invade festas de elite, onde música alta e consumo de drogas são frequentemente denunciados? A resposta é óbvia: o alvo nunca foi o comportamento em si, mas a população que o pratica.
A audiência terá participação interativa, mas é pouco provável que representantes da segurança pública ou do Judiciário assumam qualquer responsabilidade. Afinal, como explicar que, em pleno 2025, o Brasil ainda trate sua cultura negra como caso de polícia? Enquanto isso, movimentos sociais pressionam por políticas que reconheçam o funk, o passinho e o hip hop como patrimônios culturais — e não como ameaças.
Uma coisa é certa: enquanto o Estado não encarar seu racismo estrutural, a criminalização da periferia seguirá sendo não só uma violência, mas uma forma de apagamento histórico. O debate está aberto. O resto é silêncio cúmplice.