Conheça Valéria Almeida apresentadora que vem conquistando o público do programa “Encontro” 

A comunicadora recebeu a Revista Raça com petiscos e drinks, em seu apartamento em São Paulo. Uma vista linda e uma entrevista entre gargalhadas vibrantes e silêncios saudosos, três horas de encontro sob o pôr do sol de uma janela com visão panorâmica e luz natural estonteantes.

FAMÍLIA

Quando perguntamos pra Valéria sobre a família, ela dividiu conosco que perdeu a mãe (Maria Aparecida, mais conhecida como Cidinha FM) muito cedo, com 10 anos. O pai Walmir também faleceu jovem (aos 53 anos), estudou até a 7a série, pois teve que mudar a rota para cuidar do pai que adoeceu. Os avós por parte de mãe que a criaram. O avô morreu sem ter acessado a escola e a avó faleceu no início da pandemia, a pessoa que a Val mais conviveu ao longo da vida.

Valéria Almeida – “Minha vó dizia, não importa o que aconteça, nunca deixe de estudar e trabalhar, nunca troque seus estudos e trabalho por homem algum. Minha avó foi minha grande inspiradora e motivadora para minha educação e vida, minha avó deixou de ser empregada doméstica para cuidar de mim quando nasci, dando suporte à minha mãe que havia passado no concurso dos correios”, comenta. Até os 10 anos a base sólida, mãe trabalhando no correio, pai nas docas do porto de santos, 4 irmãos por parte de pai (Walmir Jr., Vinícius, Vitor e Gustavo), Val a mais velha. A mãe da Val, uma capacidade de perdoar absurda, o pai, trouxe valores do trabalho honesto.

Valéria, nome escolhido pelo pai da Val, o mesmo dizia, que era o nome da única que teve uma vida próspera, portanto, projetava o mesmo pra ela. A mãe achava que essa amiga era uma namoradinha, será? (risos)

INSPIRAÇÕES

Valéria Almeida – Quando resolvi fazer a faculdade de jornalismo, assistia mais tv e tinha minhas inspirações como Glória Maria e a Fátima Bernardes.

Glória, uma mulher negra ocupando um espaço na televisão, viajando, contando histórias e me inspirando neste lugar, já Fátima, viajava e ocupava esses espaços majoritariamente dominado por homens brancos, mulher casada, com filhos, mas continuava ocupando esses lugares”. Me inspiravam, mas não me via, pois achava que aquele cenário era distante da minha realidade.

CARREIRA

Jornalismo? Estava como primeira, segunda e terceira opção de estudo, o que mudou mesmo foi o turno. Optar por estudar no período da manhã, tarde ou noite (risos), Val superafirmou.

Valéria Almeida – “Morava em um lugar de periferia e prestava muita atenção nas histórias que eram contadas na TV. Meu bairro só saia no jornal nas páginas policiais. Haviam várias histórias incríveis no bairro e elas não eram contadas. Por volta dos meus 17 anos, entrei na faculdade. Eu tinha a certeza que eu queria ser uma contadora de histórias. Eu acreditava que fazer jornalismo mudaria minhas experiências, teria a oportunidade de viajar o mundo, contando histórias, mudando a minha e possivelmente impactando outras realidades”.

Muitos obstáculos na minha formação, entendi o que era morar numa periferia, quando já estava na faculdade. A combinação procurar trabalho, com foto no currículo (sendo uma pessoa preta) e o endereço na periferia, me deixou 9 meses sem conseguir uma colocação profissional. Quando comecei a alterar o endereço que morava, a inserir lugares não marginalizados, o cenário foi mudando, mas até o final da graduação muita coisa aconteceu.

Quando saí da faculdade, trabalhei numa assessoria de imprensa como estagiária. Como não via muito futuro na agência e eu adorava fotojornalismo, disciplina da faculdade, me via desempenhando esse papel. No fim do curso, meu pai entendeu que a fotografia era importante pra mim, me deu uma máquina e passei a encaminhar currículo para ser fotógrafa nas revistas.

Algo da minha ingenuidade na época, me fez enviar currículos no final do ano, entre natal e ano novo, quando as redações param. Pra minha sorte, alguém tirou um tempo para limpar a caixa de e-mails eu brinco, e nesta limpa, o meu currículo foi resgatado (risos). Recebi retorno, a pessoa comentou que não estava contratando, mas que tinha uma amiga que precisava de uma profissional. Mesmo sem me conhecer, me indicou pra editora de fotografia da Carta Capital, na qual eu havia encaminhado meu currículo também. Me chamaram depois de poucos dias, me contrataram e foram 4 anos na revista. Primeiro como assistente de fotografia, depois fotógrafa, produtora de imagem e a saída de lá foi para entrar na Globo, que estou até hoje.

RESUMINDO, POIS SOU CONTADORA DE HISTÓRIAS E CONTO TUDO COM RIQUEZA DE DETALHES (risos) Valéria Almeida – Iniciei na emissora no profissão repórter, fiquei um mês em um teste e nunca mais saí. São 12 anos na TV, quase 6 anos no Profissão, neste período fomos indicados ao Emmy Awards, recebi dois prêmios da Globo como vídeo repórter, fui para o Bem Estar, quando era um programa, fiquei como repórter, até que migrei para o entretenimento que iniciei as matérias para o É de Casa, Encontro, até compor o quadro de apresentadoras do Bem Estar.

Considero um grande jornada, pois quando vivemos muitas violências com falta de perspectiva, a tendência é nem sonhar para nos pouparmos da dor. Mesmo a sociedade insistindo nos nãos, eu acreditava que merecia um sim.

SOBRE RESISTIR

Valéria Almeida – Hoje em um outro cenário de vida, ainda assim não tem um dia que não penso sobre quem ainda não conquistou o mínimo, e vou me fortalecendo com a trajetória da minha família, minha força ancestral e me conectando com grupos, movimentos, pessoas que tenham consciência social que vamos adicionando bagagem uns dos outros, me encontrando com mulheres e homens pretos. Ter em casa um lugar de refúgio, posso contar com meu marido que me incentiva, também acredita nos meus sonhos. Aliás, ele montou uma agência (Nagô Agência), que cuida de talentos negros, pois depois de ter sido rejeitada por várias agências, foi uma forma que encontramos de estar presente no mercado e ser acolhida. Desta forma, a agência cuida da carreira de outros profissionais batalhando por contratos publicitários. Ao invés de nos paralisar, nos impulsionou. E desta forma vamos nos fortalecendo como coletivo.

REPRESENTATIVIDADE IMPORTA, ELA INSPIRA, MAS NÃO BASTA!

Valéria Almeida – Ela não basta, mas é importante, quando falamos de representatividade na sociedade atual, estamos falando sobre poucas pessoas que representam grandes grupos. Importante pra inspirar, mas não pode bastar, precisamos batalhar pela equidade. Nossa presença precisa ser naturalizada nos ambientes todos, especialmente espaços de poder. Quando passarmos a ser identificados com nossos nomes e sobrenomes, não pelas nossas características, aí vamos naturalizar a existência de nossos corpos e de outros grupos. Não vemos indígenas, não vemos pessoas com deficiência, temos muito a fazer.

A representatividade faz com que a gente sonhe, quando a gente olha alguém ocupando um bom lugar, isso faz com que tenhamos um ponto de apoio pra começar a sonhar. Nossos sonhos ampliam o cenário, cria-se um repertório positivo. Ao longo desses 12 anos de carreira, crianças e adultos me escrevem, pois dizem que se inspiram com a minha presença ali, as pessoas se reconhecem, se conectam, do mesmo jeito que essas imagens impactam pessoas pretas, essas imagens transformam o imaginário branco, de crianças e adultos, as pessoas tem a oportunidade de mudar a relação de subalternidade, principalmente quando essas imagens são apresentadas desde a infância.

FILHO DO AMOR

Valéria Almeida – Prova de amor é respeito, quando falo do meu enteado, pra mim é muito claro que ele tem mãe, tem pai, tem madrasta e tem padrasto, costumo dizer que ele vive em uma família ampliada. Conheci o Lucas com 2 aninhos de vida, foi amor à primeira vista. As pessoas estranham o amor por eu não ser mãe, mas essa rivalidade está no imaginário coletivo. É um privilégio tê-lo na vida, não pode haver disputa de afeto!

AMOR PRETO

Valéria Almeida – 14 anos de uma história que começou na praia. Eu e o Peterson estamos o tempo inteiro nos apoiando. Nos preocupamos menos com o que as pessoas esperam da relação, pensando nas relações de hoje, talvez este detalhe ajude. A gente vem construindo nossa história, a história da alegria e da tristeza é real, não largamos nossas mãos, já passamos por muitas coisas juntos, perdemos familiares, descobri uma endometriose severa quando decidi engravidar. Uma construção para além das redes sociais definitivamente.

Todos os dias, não importa o que aconteça, tomamos café da manhã juntos, mesmo se o dia anterior não foi tão bom ou se acordamos meio brigados, brindamos a vida com a xícara de café.

LAZER

Valéria Almeida – Tenho cuidado das minhas plantas, converso com elas e gosto de estar em contato com as pessoas, sem dúvidas, as viagens me trazem essa sensação. Os lugares trazem bons encontros. Quando viajo, vou aberta para viver a cultura, ouvir, trocar.

MODA | Meu amarelo vibrante, é meu pretinho básico

Valéria Almeida – Como nos vestimos, é uma expressão resumida do que somos, de como nos posicionamos, como nos vemos, é uma exposição da alma andando pela rua. Não sou pautada pelas tendências, mas as vezes, as tendências falam com a minha alma, aí só aproveito! Sou vibrante, sou alegre, não sou a pessoa que gosta de usar preto. Meu amarelo é meu “preto básico”.

Tenho muitas roupas e uma relação antiga com elas, eu entendo que são recursos da natureza que estamos usufruindo. Tenho este comportamento e cuidado, pois em casa, a roupa de uma prima passava pra outra, e pra vizinha e quando não servia, passávamos pra frente. Eu repito até minha roupa ter história pra contar. Gosto de roupa elegante e que me deixe livre. Que eu tenha a liberdade de cruzar as pernas, sentar de perna aberta, que me dêem liberdade de movimento e felizes (peças escandalosas, coloridas).

Acho também que temos que ficar atentos com os gatilhos em tempos de redes sociais. Antes, usávamos a mesma roupa em 5 eventos, agora, existem questionamentos em usar a mesma roupa, em aparecer em uma foto com mesmo look. No meu caso, uso sim, uso mesmo. Roupa é investimento, é custo, é dinheiro. Se é pra ser descartável, melhor pegar emprestado da amiga (o). Acredito que a moda é uma expressão da gente e não podemos ficar reféns das exigências da rede.

Recentemente, usei a saia herdada da minha avó. Um dia comentei com ela, que lembrava que segurava na barra da saia dela para atravessar a rua, perguntei onde estava aquela saia bonita, ela trouxe pra mim, a saia estava impecável! Se fizermos um recorte de quantos anos a saia existe, é uma peça que tem mais de 30 anos. Quando usei a saia, fiz um reels no instagram, o conteúdo tem quase 500 mil visualizações no instagram, resumindo, a moda é cíclica e minha ligação com a moda é pautada na memória afetiva, tudo repertório imaginário. E claro que vamos comprar, a questão hoje é a responsabilidade que precisamos ter ao consumir. Não vou colocar minha alma escandalosa na forma da sociedade.

COLORAÇÃO PESSOAL

Valéria Almeida – Quando fiz, fiquei feliz que tudo que já tinha no guarda roupa fazia sentido. Sou Primavera Brilhante, costumo dizer que meu espírito é escandaloso(rs).

CABELOS

Valéria Almeida – Meninas e mulheres compartilham suas histórias de cabelo comigo, ainda é uma questão política como mulher negra, somos um ato político. Acredito que nossa beleza ainda é um vetor transformador no imaginário da população, meu desejo é que ocupemos os lugares um dia, sem que nosso corpo seja a pauta, que possamos passear naturalmente sem virar tema. No passado, foram diversas fases com meu cabelo, cheguei a alisar o cabelo duas vezes por mês.

Sempre gostei do meu cabelo crespo, mas não tinha estrutura emocional para lidar com as agressões por conta da minha estética visual. Quando vi a Valeria Valenssa na TV, fiz permanente, mas eu prendia o cabelo por conta da hostilidade das pessoas, mas quando vim para São Paulo e tive a oportunidade de ir em um evento com inúmeras mulheres pretas, entendi o lugar que me sentia bem para expressar minha verdade, ali me sentia fortalecida para ser eu mesma. E essa conexão com outras mulheres pretas acontece, não à toa, mulheres negras me escrevem nas redes sociais. Poderia ou deveria ser só um cabelo, mas ainda é um posicionamento que transforma.

E o problema não é em fazer escova, alisar, o problema é modificar a estética para se encaixar na sociedade. Uso cabelo crespo de 2006, 56% da população negra é gente demais para causar tamanho estranhamento nas nas pessoas até hoje.

ESPERANÇAR

Valéria Almeida – Sou a pessoa que gosta de ver o lado bom da vida, acredito que temos atravessado momentos de muita hostilidade, pouca tolerância e respeito ao outro. Tenho o desejo de esperança pra este ano, que seja transformador para que encontremos um caminho de respeito, prosperidade e que assim consigamos ver mudanças sociais reais para o coletivo, que não tenhamos tantas histórias de dor pra contar. Que transitar e ver muitos mais dos nossos com boas histórias pra contar.

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