Daniele da Mata transforma pinceis em ferramenta de empoderamento racial
A maquiadora Daniele da Mata está reescrevendo a narrativa sobre beleza negra no Brasil. Em entrevista ao programa Negros em Foco da TV Cultura, ela desmontou a ideia de que maquiagem é mera vaidade: “a maquiagem é instrumento, é uma ferramenta poderosa” de afirmação identitária e luta contra o racismo.
Com mais de 15 anos de experiência, Daniele revela que seu trabalho nas periferias de São Paulo revelou um grito silencioso: “Ia ser através da maquiagem que elas entenderiam o quanto são bonitas”. Segundo ela, as mulheres negras buscavam muito mais que técnicas: “As alunas queriam a técnica mas queriam também se encontrar” – um processo de resgate da autoestima corroída por padrões eurocêntricos.
A exclusão cosmética
A profissional expôs barreiras históricas: “a maior dificuldade era trazer essas pessoas, porque sempre teve falta de produto para essa pele”. A escassez de bases e corretivos para tons profundos, comum até recentemente, simbolizava uma negação: “produtos, serviços, tudo isso antes eram coisas que a gente (mulheres negras) simplesmente não tinha”.
Daniele lembra que marcas ignoravam 56% da população brasileira – hoje o mercado de cosméticos para pele negra movimenta R$5,8 bilhões/ano, mas a democratização ainda é incompleta.
Beleza como ato político
Cada pincelada nas oficinas de Daniele vira manifesto:
- Cores vibrantes que celebram a melanina, em contraste com padrões de “pele nua” que invisibilizam traços negros;
- Técnicas adaptadas para rostos com estruturas diversas, descolonizando tutoriais massivos;
“Quando uma mulher negra olha para seu rosto amplificado pela maquiagem e finalmente se reconhece, isso é revolução”, afirma. Seu projeto já impactou 2 mil mulheres, virando referência para marcas que hoje reformulam paletas.
Para Daniele, o boom de maquiadores negros como Raphael Costa e Joyce Rodrigues comprova a mudança, mas alerta: “Empoderamento não é só ter produtos. É ver nossa beleza natural celebrada sem precisar de adaptações”. Seu próximo passo é uma linha acessível com 20 tons de base – resposta concreta ao passado que ela ajudou a enterrar.