Desfile promove valorização da diversidade e afroempreendedorismo no DF
Ex-morador de rua, o modelo Adriano Lugoli desfilou como convidado especial. Resgate da autoestima e incentivo às iniciativas empreendedoras também são objetivos do evento, dizem organizadores.
Como forma de promover iniciativas empreendedoras e inclusivas no Distrito Federal, o Desfile Beleza Negra realizou a primeira edição especial no último sábado (1°), em Taguatinga Norte, no DF.
Como convidado especial, os brasilienses puderam rever o modelo Adriano Lugoli, que encontrou nas passarelas a força para deixar as ruas e superar a dependência do crack.
Quem vê o desfile de um dos nomes mais especiais desta edição, não imagina a história de vida de Lugoli. Ele viveu quase três anos nas ruas, depois de ser expulso de casa por vender pertences da família para comprar droga.
“Eu morava numa cracolândia, na rua, era viciado. Quando me internei em uma casa de recuperação em Brasília, decidi ficar.”
Superado o tratamento, Lugoli casou e teve filhos. Durante a gravidez da esposa, a família ganhou um ensaio fotográfico e, desde a primeira foto postada em redes sociais, os desfiles e o mundo da moda se tornaram sua profissão.
Sobre a valorização da própria beleza, após anos de vício e vivência nas ruas, o então modelo conta como passou a valorizar os próprios traços físicos. “Nunca pensei que poderia ser modelo”.
“Nunca gostei de tirar foto, nunca me achei bonito. Na escola, eu tinha os piores apelidos. Tenho uma etnia muito forte, muito bem definida, sou ‘africano’ mesmo, mas existe preconceito”, disse.
Mas, desde o primeiro desfile, na segunda edição do Beleza Negra, o modelo percebeu que a diversidade étnica estampada em seus traços é o que iria ajudá-lo a fazer muitas propagandas. “Era difícil até na minha cabeça, sempre sofri preconceito por causa disso, eu não gostava”.
“Aquilo que eu achava que era ruim foi a marca que me ajudou. Hoje eu gosto e me aceito. Me considero bonito.”
Para uma das organizadoras do evento, a produtora Dai Schmidt, a intenção do desfile – voltado para valorização da beleza negra – não é segregar, mas mostrar a diversidade e “ajudar a livrar jovens e adolescentes do ócio, das ruas e resgatar a autoestima rumo à construção da cidadania”.
“A intenção é mostrar igualdade. Trabalhamos muito com inclusão social, e parte dos modelos vêm de uma realidade financeira restrita.”
Outros 20 modelos desfilaram para o evento, profissionais que no dia-a-dia exercem outras atividades. “Por traz dos rostos e corpos bonitos, existe muito mais que uma coleção inverno”, explica Dai.
“São mecânicos, eletricistas, atendentes de lanchonete, enfim, lutas que só reforçam a importância desta ação que é fomentada numa lei que deixa claro o recado em busca do incentivo empresarial no mercado publicitário de um modo geral, na contratação de mais negros”.
A lei que a produtora se refere é a de nº 5.447/2015, que cria o “Programa Afroempreendedor” no Distrito Federal e estimula inciativa próprias que “visem à igualdade de participação no mercado de trabalho”.
Ao todo foram 40 ”looks” montados e expostos a cerca de 1.500 pessoas que foram conferir as novidades da moda outono-inverno. A próxima edição do evento está prevista para o mês de novembro, em Brasília.
Desigualdade de rendas
Um estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), órgão da ONU, em parceria com a Fundação João Pinheiro e o Ipea, divulgado no último mês de maio, mostra as desigualdades de renda ainda existentes entre a população que se autodeclara branca e as pessoas negras.
Segundo o documento “Desenvolvimento humano para além das médias”, em 2010, a renda domiciliar per capita média da população branca era mais que o dobro da população negra: R$1.097,00 para R$ 508,90.
Quanto à escolaridade da população adulta, o estudo aponta que no início da década, 62% da população branca com mais de 18 anos possuía o fundamental completo, ante 47% da população negra. A diferença na esperança de vida ao nascer entre brancos e negros era de 2 anos – respectivamente 75,3 anos e 73,2.
Apesar das desigualdades de renda, de acordo com o levantamento, entre 2000 e 2010 o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) da população negra cresceu, em média, 2,5% ao ano, frente aos 1,4% anuais dos brancos.
Mas, apesar do ritmo mais acelerado, só em 2010 o IDHM dos negros alcançou a pontuação (0,679) que já havia sido atingida pelos brancos dez anos antes (0,675). De acordo com a metodologia, quanto mais perto de 1, melhores as condições de vida.
Em sete estados, e no Distrito Federal, os negros tinham desenvolvimento humano considerado alto. Nos 19 estados restantes, era médio. Para a população branca, dois estados e o DF estavam na faixa de muito alto desenvolvimento humano, 23 estavam na faixa alta, e apenas 2, na faixa de médio desenvolvimento humano.