Dia da África. Celebremos as nossas lutas e conquistas!
Por Tadeu Kaçula
Quando temos contato pela primeira vez com a história da África pelo sistema de educação ocidental, nossos imaginários são condicionados a construir como referência um território empobrecido, subdesenvolvido e etnicamente singular. Há registros sobre a história da África identificados por documentos que datam do século VIII a.C. ao século V d.C.
Segundo estudos arqueológicos e antropológicos, a origem do homem está muito ligada ao continente, já que foram encontrados, em diversas regiões da África, restos de hominídeos e fósseis de homens de Neandertal.
O continente africano abriga uma população de 1,216 bilhões de habitantes, é formado por 56 países em uma área territorial de 30.370.000 km. A região Norte do continente, segundo a história, é o espaço mais antigo do mundo. Por lá ficam países como Marrocos, Egito, Líbia, Argélia e Tunísia, que estão junto ao Mar Mediterrâneo.
Entre os grandes reinos que se desenvolveram por lá, destacam-se os reinos de Ghana, Mali e Songhai, na ordem cronológica. Quando lemos esse breve resumo da história da África, fica nítido que não é possível abordar apenas uma cultura ou etnia, pois o continente é dotado de uma pluralidade étnica e multicultural.
A colonização europeia do continente africano durou séculos e deixou uma um legado de apagamentos epistemológicos de dezenas de etnias além da extração de milhares de dólares em riquezas naturais, tráfico de seres humanos e invasão de terras habitadas há séculos por povos remanescentes das antigas civilizações africanas.
Depois de séculos de exploração colonial, os países africanos iniciaram uma série de insurgências contra os colonizadores lutando para libertar seu povo da subordinação ocidental. Após muita luta e resistência os países africanos se tornaram independentes e esse acontecimento foi marcado com muita comemoração e sentimento de novas perspectivas políticas, econômicas e sociais para milhões se pessoas em todo o continente.
O Dia da Liberdade de África é a comemoração anual da fundação da Organização da Unidade Africana (OUA), hoje conhecida como União Africana, a 25 de maio de 1963. É comemorado em vários países do continente africano, assim como em todo o mundo.
Segundo consta no histórico da OUA, o primeiro Congresso dos Estados Africanos Independentes realizou-se em Acra, no Gana, a 15 de abril de 1958. Foi convocado pelo Primeiro-Ministro do Gana Dr. Kwame Nkrumah, sendo composto por representantes do Egipto, então parte integrante da República Árabe Unida, Etiópia, Gana, Libéria, Líbia, Marrocos, Sudão, Tunísia e a União Popular dos Camarões. A União da África do Sul não foi convidada.
A conferência apresentou o progresso dos movimentos de libertação no continente africano, simbolizando também a determinação dos povos da África para libertar-se do domínio e exploração estrangeiros. Embora o Congresso Pan-Africano estivesse trabalhando em direção a objectivos semelhantes, desde a sua fundação, em 1900, esta foi a primeira vez que uma reunião deste género teve lugar em solo Africano.
A Conferência apelou para a instituição de um Dia Africano da Liberdade, um dia que “…a marcasse a cada ano o progresso contínuo do movimento de libertação, e que simbolizasse a determinação dos povos de África, para libertar-se do domínio e exploração estrangeiros.”
A conferência foi notável por ter criado a base para as reuniões subsequentes de chefes de estado e de governo africanos, na era do Grupo de Casablanca e do Grupo de Monróvia, até à formação da OUA em 1963.[carece de fontes].
Cinco anos após o Primeiro Congresso, a 25 de maio de 1963, representantes de trinta países africanos reuniram-se em Adis Abeba, na Etiópia, tendo por anfitrião o Imperador Haile Selassie. Mais de dois terços do continente havia já obtido então a independência, sobretudo dos estados imperiais europeus. Neste encontro, a Organização da Unidade Africana foi fundada, com o objetivo inicial de incentivar a descolonização de Angola, Moçambique, África do Sul e Rodésia do Sul. A organização comprometeu-se a apoiar o trabalho realizado por combatentes da liberdade, e remover o acesso militar às nações coloniais. Foi estabelecido uma carta de princípios que procurou melhorar os padrões de vida entre os estados-membros. Selassie, exclamou: “Possa esta convenção da união durar mil anos.”
A carta foi assinada por todos os participantes no dia 26 de maio, com a excepção de Marrocos. Nessa reunião, O Dia da Liberdade de África foi renomeado Dia da Libertação de África. Em 2002, a OUA foi substituída pela União Africana. No entanto, a celebração, renomeada como Dia de África continuou a ser comemorada a 25 de maio, por respeito à formação da OUA.
Conhecer a história da África e suas diásporas, compreender sua pluralidade étnica, cultural, política e social e entender a sua importância para a formação da identidade de povos em todos os continentes é fundamental para que possamos nos aproximar da nossa matriz ancestral. Conhecer África como ela realmente é, sobretudo essa África contemporânea, tecnologia e rica em valores intelectuais, nos permite desconstruir estereótipos e criar uma nova conexão com o nosso continente matriarcal. Amar a África é amar a nós mesmos!
Fonte: África: Revista do centro de Estudos Africanos. USP. S. Paulo, 11-1- (1988)
Tadeu Augusto Matheus – Sambista, sociólogo formado pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Mestre e Doutorando em Mudança Social e Participação Política pela Universidade de São Paulo (USP), Coordenador executivo da UNAFRO – Universidade Livre Afro-brasileira, membro do grupo de Estudos Latino Americano sobre Cultura e Comunicação (CELACC – USP), membro do grupo de estudos Griô de cultura popular e educação da Universidade Federal da Bahia – (UFBA), autor dos livros Casa Verde: uma pequena África paulistana (LiberArs Editora), Samba e Pandemia: 2021, o ano que o samba parou (Proac), A Imprensa Negra na Década de 1930: Frente Negra Brasileira e o Jornal A Voz da Raça (LiberArsEditora). Autor convidado no livro Cultura Política nas Periferias – estratégias de reexistência.