Emanoel Araújo – para nunca esquecer

Por: Zulu Araújo

E lá se foi um dos maiores artistas plásticos brasileiros – Emanoel Araújo. Escultor de primeira grandeza. Faleceu numa data histórica, provavelmente para coroar uma trajetória histórica, aos 81 anos de idade. Emanoel não foi nem quis ser uma pessoa qualquer. Ele era especial, genial, irrequieto, polêmico e, sobretudo ousado em tudo que fazia. Ele também foi um dos grandes curadores desse país, tendo realizado exposições memoráveis a exemplo de – O Benin está vivo ainda lá – Ancestralidade e Contemporaneidade, um rico passeio pelo mundo mágico dos fons, adjás, peuls, yorubas que povoam não apenas as terras da África, como também as terras brasileiras, assim como nossos corações e mentes.

Além disso, Emanoel era um pesquisador meticuloso e um colecionador de rigor estético que beirava a perfeição. É daí que surge uma de suas exposições/livro das mais importantes – Para Nunca Esquecer: Negras Memórias/Memórias de Negros, onde ele afirma “Se o Brasil conseguiu ser indiferente aos danos causados a seus filhos negros, os próprios negros desse país, os que vieram da África e os que aqui nasceram, de pais e avós brasileiros, deram talvez a mais generosa contribuição para a construção do Novo Mundo” e apresenta ao país de forma didática a gigantesca contribuição civilizatória que os afro-brasileiros deram e continuam dando a Cultura nacional.  

Emanoel também se deu ao luxo de ser diretor de duas das maiores instituições brasileiras no campo das artes: a Pinacoteca de São Paulo e o Museu Afro-Brasil do qual também foi criador. Ou seja, Emanoel Araújo, em que pese ser um ranzinza de primeira, esbanjava talento e criatividade e isso é o que importava. Ele era baiano, da cidade de Santo Amaro da Purificação, conterrâneo dos Velosos (Dona Canô, Caetano e Betânia) e conquistou São Paulo, única e exclusivamente por conta do seu talento. Foi o primeiro negro a dirigir a Pinacoteca e fez uma gestão marcante, introduzindo artistas negros no seu acervo.

Emanoel era indomável, no sentido literal da palavra. Quando Secretário de Cultura da cidade de São Paulo (José Serra – Prefeito) pediu demissão com uma carta explosiva: “A minha saída justifica-se por ter sido internado sem nenhuma infraestrutura numa secretaria desprovida de recursos humanos, “apagando incêndios” deixados pelo meu antecessor…”. e ainda ameaçou o Prefeito, “não toque com sua impropriedade no Museu Afro-Brasil porque este é uma conquista de anos”.

Guardava uma forte magoa da sua cidade natal, Santo Amaro, assim como da Bahia, por considerar que apesar de ser reconhecido e reverenciado mundo afora nunca o foi, ao menos com a grandeza que merecia em sua cidade/Estado. Creditava isso ao ranço escravocrata que ainda se faz presente não só em Santo Amaro, como em boa parte do nosso Brasil. Aqui vão algumas das suas honrarias que justificam sua indignação – Medalha de ouro na 3ª Bienal de Florença/Itália (1972), melhor escultor pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA – 1982), professor de artes gráficas e escultura no Arts College, na The City University of New York. (1988), De 1992 a 2002, Diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo – Pesp, (1992/2002) e Curador e Diretor do Museu Afro Brasil São Paulo (2004). E ao que tudo indica esse sentimento ele levará para o túmulo, pois o Governo do Estado de São Paulo decretou três dias de luto oficial após sua morte como reconhecimento da sua importância. 

Na sua obra literária/exposição – A mão afro-brasileira, considerada a mais potente e importante, Emanoel faz um delicado e profundo passeio pelas artes brasileiras, apresentando e provando o quanto foi importante a contribuição dos descendentes de africanos no desenvolvimento da nossa cultura, para muitos estudiosos,  esse trabalho é “o mais ousado da historiografia brasileira relacionada à participação negra nas artes plásticas, uma vez que até a sua publicação “não existia nenhum trabalho mais sistemático de alguma profundidade sobre o tema”“.

Enfim, importante dizer que Emanoel Araújo era negro e gay de forma plena, sem que para isso fizesse uso do clássico ativismo em forma de movimentos. No entanto era absolutamente intransigente na defesa dos seus direitos, assim como solidário com todo e qualquer movimento que defendesse a igualdade, fosse ela de que natureza fosse. Obrigado Emanoel Araújo pelo eu legado, pela sua valiosa contribuição para a cultura brasileira e, principalmente pela sua coragem em “tornar-se negro” sem pedir licença a ninguém.

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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