Enquanto bonecas reborn — bebês de silicone hiper-realistas — ganham afeto de adultos em busca de vínculos sem compromisso, milhares de crianças reais seguem esquecidas nos abrigos do país. A maioria é negra, tem mais de cinco anos e quase nunca corresponde ao perfil desejado por quem pretende adotar.
Segundo o Sistema Nacional de Adoção, quase 70% das crianças disponíveis são negras, mas a preferência ainda é por meninas brancas e com menos de dois anos.
Para a assistente social Denise Ferreira, referência em adoção étnico-racial, essa desigualdade revela um racismo estrutural que nega até o direito ao pertencimento familiar. Ela explica que há rejeição explícita a crianças pretas de pele retinta e reforça: “adotar criança negra é um ato de resistência”.
Denise também critica o simbolismo das bonecas realistas sendo cuidadas enquanto crianças reais seguem sem família. Para ela, isso escancara afetos condicionados por aparência, controle e fantasia. E conclui: “Amar uma criança negra é também lutar por ela num país que ainda insiste em rejeitá-la”.