Entrevista sobre a prática da capoeira
Veja trechos da entrevista com o Mestre de Capoeira Tonho Matéria sobre a prática do esporte
TEXTO: Marla Rodrigues | FOTOS: Maurício Requião e Divulgação | Adaptação web: David Pereira
Em Salvador, pergunte por Antonio Carlos Gomes Conceição. É certo que a maioria das pessoas não vai associar a imagem ao nome. Agora, procure por Tonho Matéria, músico e capoeirista que tem mais de 300 músicas gravadas por grandes nomes, como Daniela Mercury, Chiclete com Banana, Olodum e Beth Carvalho, entre outros, e que desenvolve trabalhos sociais levando a arte da capoeira e todas as suas boas consequências para crianças, jovens e adultos de Salvador. Pronto, achou! Tonho Matéria é o que podemos chamar de uma figura popular da cidade. Destaque à frente de dois dos grandes blocos afros de Salvador, ele inovou ao levar para os palcos uma performance, digamos, capoeira/musical, união perfeita da batida e ritmo fortes do axé, com a ginga e a atitude da capoeira. Dessa forma, ganhou o mundo, com apresentações na França, Grécia, Austrália, nos Estados Unidos, em Moçambique e na Itália. Em 2001, fundou a Associação de Capoeira Mangangá, que incentiva a prática da capoeira como instrumento de inclusão social, fortalecimento da cultura e educação para a cidadania, resgate do orgulho étnico e de afirmação identitária. O sucesso de Tonho como artista está diretamente ligado à capoeira.
Confira trechos da entrevista com o Mestre de Capoeria, Tonho Matéria:
Quando a capoeira surgiu em sua vida?
Em 1975, através de um disco do mestre Caiçara e outro do mestre Suassuna. Comecei a escutar o som da capoeira através de um vizinho, o “Seo” Popó, que todos os domingos tocava esses discos, era uma overdose aquilo lá, e eu adorava ficar ouvindo. Com 12 anos, comecei a treinar capoeira. Ela entrou na minha vida assim, meio que de brincadeira. Aos domingos, juntava uns meninos e ficava jogando sem me preocupar se estava fazendo certo ou errado. Íamos descobrindo a ginga. Depois, meu compadre Tico, que morava em frente à minha casa, me iniciou na capoeira.
O que é ser um verdadeiro mestre de capoeira?
É ir além de tocar um berimbau, jogar as pernas pra cima e de tocar um pandeiro. Ele tem que estar preparado para a vida, tem que se respeitar e respeitar as diversidades, entender a formação cultural, social e econômica para ajudar aquele aluno que não tem dinheiro para comprar nem sequer um fardamento ou até mesmo se alimentar.
Você é contra ou a favor das “rodas de rua”?Sempre a favor! Hoje não existem mais muitas rodas de rua e sim muitos grupos fazendo rodas nas ruas, ou seja, uma capoeira livre, sem estereótipos, sem obrigações com o que é certo ou errado.
Você fundou, em 2001, a Associação de Capoeira Mangangá. Fale um pouco sobre este trabalho.
É uma instituição sem fins lucrativos que promove ações afirmativas voltadas ao bem- estar dos seus associados, atendendo uma faixa etária de 3 a 40 anos, sem discriminação de gênero, etnia ou classe socioeconômica. Buscamos assegurar às crianças, aos jovens e adultos – moradores em bairros periféricos da cidade do Salvador e região metropolitana – por meio do aprendizado e prática da capoeira, a oportunidade de conhecimentos que proporcionem a eles uma formação como indivíduos, a construção de sua cidadania e a elevação de sua autoestima. É um projeto social com muitas vertentes.
Você é cantor, compositor e um influente agitador cultural, mas, sem a capoeira, nada disso existiria em sua vida. É isso mesmo?
A capoeira é a minha vida, sou um profissional da capoeira.E não escolhi este esporte, ela me escolheu, me viu menino jogando nas esquinas do meu bairro, Pau Miúdo. Para mim,a capoeira é luta de resistência ativa, é a cultura que anda, é a minha alimentação, meu refúgio, meu tudo, meu equilíbrio como homem, cidadão, pai, aluno e mestre. A capoeira pra mim só será um hobby quando eu concretizar todos os meus sonhos e tornar vivas e reais as minhas missões. Será um estilo de vida quando eu não mais precisar dela para lutar contra o preconceito, a discriminação, a falta de oportunidade para meus meninos negros da Associação Cultural de Capoeira Mangangá e de outras associações.
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