Fake News mata! Pobre, preto mulher e criança.

Colunista: Juliano Pereira

Nas últimas semanas, não se fala em outra coisa. A catástrofe que deixou o Rio Grande do Sul debaixo d’água é um sinal dos novos tempos. Difícil de aceitar, mas os cientistas já alertavam. A natureza está respondendo ao nosso modo de vida e consumo. Sim! A culpa é de todos nós! E, pra piorar, muita gente está usando a tecnologia pra jogar contra, compartilhando desinformação e fake news.

Até o momento, temos centenas de mortos e desaparecidos. São milhares os desalojados e um estado em crise humanitária. Estima-se que será preciso mais de uma década para reconstruir o Rio Grande do Sul. Veja, não se pode mais negar as mudanças que provocamos no clima. Se elas ainda não afetaram você, é questão de tempo. Qualquer coisa diferente disso é negacionismo, burrice e fake news.

E são os mais vulneráveis que irão pagar a maior parte da conta. A desigualdade também é climática. Pobres, pessoas pretas, mulheres e crianças são quem mais sofrem e sofrerão as consequências. As catástrofes farão cada vez mais parte da nossa realidade.

Duvida? Então dê no Google: “aquecimento global no Brasil”. A resposta será: temperaturas mais altas, mais secas e incêndios pelo país. E, na região Sul, chuvas torrenciais. Tudo será mais frequente e intenso. Aproveite também e pesquise sobre “refugiados climáticos”. Só em 2022¹, 32 milhões de pessoas no mundo precisaram se mudar porque suas casas ficaram inabitáveis. Isso equivale à população do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. E o número de refugiados só vai aumentar.

Não bastasse todo o problema, há ainda quem lucre com a desgraça alheia. Não só quem vende água a 100 reais, mas quem aproveita a situação para promover desinformação. Imagina o cinema pegando fogo, você e sua família desesperados para fugir, e alguém indica, irresponsavelmente, a saída de emergência falsa? Pois é o que está acontecendo nas redes sociais.

“Ora Juliano, o assunto é grave e tal, mas por que falar aqui?”.

Porque as fake news são perigosas. Elas se alastram como fogo, já que as pessoas tendem a dar mais atenção às notícias negativas, que chocam, incluindo conspirações malucas². É a mesma receita que faz o Datena capturar tanta gente por décadas³. Tampouco podemos esquecer das redes sociais que são permissivas – desenhadas para gerar lucro para as Big Techs a partir de cliques – sem se importar se os conteúdos são verdadeiros ou não. E, infelizmente, a impunidade ainda impera.

Nas últimas semanas, famílias gaúchas foram impactadas por falsas notícias que falavam que o governo distribuiu comida vencida e que doações seriam retidas por falta de nota fiscal⁴. Imagina seu filho com fome, sua casa inundada, e você recebe essa informação?

No Brasil, durante a pandemia, os negacionistas disseminaram informações falsas a torto e a direito. Resultado: de cada 5 mortes causadas pela COVID, 4 poderiam ser evitadas. Os dados são do Senado Federal⁵. Mais de 400 mil pessoas(!) perderam a vida desnecessariamente, além de sobrecarregar hospitais, já sem leitos e sem cilindros de oxigênio.

Outro exemplo: as eleições. Uma máquina de ódio pulverizou mentiras, ameaçando a democracia, desacreditando a urna eletrônica, que culminou nos ataques de 8 de janeiro. Os mandantes seguem impunes. Veja, a lista é longa e casos de fake news e desastres climáticos andam lado a lado, não por acaso. Precisamos nos mobilizarmos para quebrar esse ciclo vicioso.

Porque para as pessoas em situação de vulnerabilidade, que vão pagar o preço da maior parte das mentiras contadas, e para os nossos filhos, que vão viver em um mundo ainda mais hostil, cada notícia falsa é como uma nova tempestade que vai enchendo um pouco mais um rio prestes a inundar. As águas não vão poupar ninguém, exceto os poderosos, que vão passar em barcos dando tchau.

1) https://www.acnur.org/portugues/2024/01/08/apelo-global-do-acnur-2024-um-chamado-urgente-a-solidariedade-internacional/

2) Naruhodo #262 – Por que damos mais atenção às notícias ruins?