Goleiro negro dar azar

Esse mantra que tomou contou do Brasil, (Goleiro negro da azar) desde a Copa de 1950, quando a seleção brasileira de futebol perdeu a final para o Uruguai por 2x, com um gol histórico de Gighia, e tinha Barbosa (negro) um dos maiores goleiros da época, defendendo o gol da seleção brasileira.  

E essa pecha se espalhou de tal forma no futebol brasileiro, que o Brasil só veio a ter um outro goleiro negro defendendo a seleção brasileira, em 1966, portanto 16 anos após a fatídica copa de 50. O sortudo foi o goleiro Manga, que era goleiro do Botafogo do Rio de Janeiro, mas que só disputou uma única partida pela seleção. 

Depois de Manga tivemos Dida, um dos maiores goleiros de todos os tempos. Era um especialista em defender pênaltis, tendo sido considerado um dos maiores goleiro do mundo e sido premiado com o Hall da Fama. 

Mas, isso só veio ocorrer, 40 anos depois, em 2006. 

Ou seja, o racismo brasileiro é coisa séria. É tão arraigado, tão resiliente, que até mesmo no esporte mais popular do país, onde os negros são as grandes estrelas, ele se manifesta de forma cruel, não apenas fora do campo, mas também dentro, reproduzindo uma das marcas mais nocivas do racismo que é retirar dos negros e negras a confiabilidade. 

É daí que vem a expressão: “Não confio em goleiro negro”. Não precisa de nenhuma explicação. Afinal, negro não é confiável e ponto. 

Recentemente o jovem goleiro Hugo do Corinthians, uma das grandes promessas da posição, bradou feio no programa Boleiragem da Globo: “Uma falha minha vai ser muito mais passada para a frente do que de outro goleiro branco. Se eu falhar, meu vídeo vai rolar três dias, de um goleiro branco não, vai ser esquecido”

E a razão dessa certeza do goleiro Hugo, já havia sido afirmada há mais de trinta anos atrás, quando Barbosa, numa entrevista, disse: “Qual é a pena máxima no Brasil? Não são 30 anos? Pois eu já estou a mais de 40 anos cumprindo e ninguém esquece. Se eu fosse um criminoso vulgar, eu entenderia. Mas qual foi o meu crime? Qual foi o meu pecado?”

Aranha, outro grande goleiro do futebol brasileiro, e que foi vítima de racismo inúmeras vezes, por parte de torcedores racistas, foi certeiro ao identificar as razões de todo esse ódio que uma parte da sociedade brasileira tinha por Barbosa e de responsabilizá-lo pela derrota na copa de 50. 

“Não foi pelo gol que o Barbosa foi perseguido. Foi pelo que ele representava. Em uma época que o futebol era uma coisa tão elitizada, ter um negro, ainda mais numa Copa do Mundo, era ruim para a imagem. Pelo menos alguns pensavam e ainda pensam assim”, 

Esse pensamento racista está presente até mesmo nos provérbios populares, do tipo: “Preto quando não erra na entrada, erra na saída”. Ou seja, não há possibilidade do preto dar certo, de fazer a coisa certa. 

E no futebol, esse estigma racista naturalizou-se há mais de 70 anos, na posição mais importante de um equipe que é a defesa, por conta desse espaço ter sido ocupado, por um negro, na primeira copa do mundo de futebol realizada no país. 

No Brasileirão de 2024, estamos assistindo a mais uma grande vitória na luta contra o racismo no Brasil.  Nunca, tantos goleiros negros estiveram presentes nos principais clubes de futebol do país. 

Portanto, parabéns a John Vitor do Botafogo, (agora campeão brasileiro), Hugo Souza, do Corinthians, Caíque do Grêmio, Everson do Atlético Mineiro e Lucas Arcanjo do Vitória da Bahia.  

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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Mestre em Cultura e Sociedade pela Ufba. Ex-presidente da Fundação Palmares, atualmente é presidente da Fundação Pedro Calmon - Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.

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