Gustavo Werneck

Por: Maurício Pestana

Gustavo Werneck é CEO da Gerdau desde 2017. Antes de assumir essa posição, foi diretor-executivo da operação Brasil, diretor corporativo de tecnologia da informação e diretor industrial da Gerdau na Índia. Formado em engenharia mecânica pela Universidade Federal de Minas Gerais, com MBAs em gestão no Insper e na Fundação Getulio Vargas (FGV), além de cursos de aperfeiçoamento no Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD), na Harvard Business School, na Kellogg School of Management e na London Business School.

Quando o senhor começou a perceber que algo estava errado na questão racial?

GUSTAVO WERNECK – Tenho refletido, como líder e cidadão, cada vez mais sobre como podemos contribuir para uma sociedade mais justa e inclusiva. Na Gerdau, nosso nível de consciência foi aumentando conforme começamos a trabalhar com o tema diversidade e inclusão na empresa, em meados de 2017. Desde então, mergulhamos nos temas dos quatro pilares que temos trabalhado internamente (Gênero, LGBTQI+, Pessoas com deficiência e Raça) e começamos a analisar os aspectos referentes a nossa demografia, inclusão e carreira em todos esses temas.
Na questão racial, tivemos que manter um olhar mais atento porque nossos indicadores mostram uma participação de 44% de negros no total de colaboradores e 25% no número de posições de liderança. Porém, se olharmos para a composição da sociedade brasileira como um todo e para posições de alta liderança ou, então, consideramos os aspectos de interseccionalidade, como mulheres negras em posição de liderança, identificamos que há muita oportunidade para avançarmos.

O senhor é dirigente de uma empresa global. Quantos negros conhece como CEOs no mundo corporativo brasileiro e no cenário mundial?

GW – No cenário brasileiro, quando falamos de grandes empresas brasileiras, realmente só me lembro da Rachel Maia.

O que acontece no Brasil é um fenômeno no qual temos empreendedoras negras de destaque, algumas delas que já trabalharam dentro de grandes empresas e que fundaram e presidem suas próprias empresas, pequenas, micro e médias, como Liliane Rocha da Gestão Kairós, Sheila Makeda da Makeda Cosméticos, Maitê Lourenço do Black Rocks, Maria Gal da Maria Produtora e Shaienne Aguiar da Mascavo Criativo. São destaques importantes que mostram a potência da comunidade negra brasileira, abrindo novos espaços. No cenário global não me lembro de um CEO negro que faça parte da minha rede de relacionamentos, ou cuja história eu tenha acompanhado no período recente.

“ No Brasil não tem racismo”, “isso é coisa que querem trazer para cá”, “assim que o negro estudar e lutar , ele vai chegar lá” . Essas frases ainda são muito comuns no meio corporativo. Como responder a cada uma dessas indagações? 

GW – Para contribuirmos com a erradicação desse problema estrutural da nossa sociedade, o racismo, é preciso assumir que ele existe. E, ao assumirmos, é preciso que nos posicionamos como cidadãos antirracistas. Também acho que é papel das empresas contribuir para a conscientização e superação desse problema estrutural, bem como promover um ambiente de trabalho antirracista e inclusivo. Na Gerdau, nos empenhamos em empregar e promover a pessoa mais bem qualificada para cada cargo e, ao mesmo tempo, valorizar e promover a diversidade entre nossos colaboradores.

É preciso valorizar as competências das pessoas: conjunto de conhecimentos, de habilidades e de atitudes. A realização de escolhas com base no mérito coloca objetividade em escolhas que podem estar sendo realizadas apenas por critérios como amizade, semelhanças com o perfil do gestor, entre outros. É preciso lembrar que não há como falar em mérito em uma sociedade tão desigual quanto a brasileira, em um sistema no qual constantemente classificamos as pessoas por serem formadas em faculdades ditas de primeira ou de segunda linha. Uma sociedade na qual o padrão estético de beleza valorizado é o branco e na qual classe social e renda são verdadeiros gargalos de acesso a direitos básicos.

A valorização da diversidade sugere perceber os nossos vieses inconscientes e enfrentar preconceitos e práticas dede discriminação centrando-se nas qualidades, características, singularidades dos profissionais e no que cada um pode agregar à empresa.

Significa não deixar de contratar alguém que é um ótimo profissional, mas… (é mulher, é homossexual, é pessoa com deficiência, é negro e assim por diante). Onde há “coincidências”, com uma equipe toda muito parecida, geralmente não se leva o mérito efetivamente em consideração. Para garantir acesso e oportunidades a TODOS, o posicionamento claro e transparente da empresa como favorável à diversidade já ajuda, pois perfis que talvez não se sentissem atraídos pela organização percebem que serão valorizados. Além disso, devem-se ampliar as formas e os locais de recrutamento de maneira que se possam alcançar profissionais de diferentes formações, culturas, raças, condições sociais, entre outros.

Também é importante ampliar o conceito de mérito e sua aplicação na gestão de pessoas. Uma empresa não é feita dos melhores talentos individuais, mas da qualidade da interação entre todos para produzir bons resultados e, nesse aspecto, a diversidade tem muito com que contribuir.

Em sua trajetória escolar e profissional, o senhor consegue se lembrar da quantidade de negros ou negras que fizeram parte do seu ambiente? Eles estavam no mesmo pé de igualdade? Tiveram a mesma ascensão que o senhor teve?

GW – A quantidade de negros sempre foi pequena e, via de regra, não estavam em pé de igualdade e não usufruíram das mesmas oportunidades profissionais que eu tive.

Desde que o senhor começou a lidar com a questão racial na sua empresa, o que mudou na empresa e no senhor nesse quesito?

LEIA MAIS: EDIÇÃO 236

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