Infância negra, nada mudou!

Crianças e adolescentes negros têm duas vezes mais chances de serem abordados pela polícia do que os brancos. A conclusão é de uma pesquisa do NEV (Núcleo de Estudos de Violência), da USP (Universidade da Universidade de São Paulo). O estudo foi realizado na capital paulistana entre os anos de 2016 a 2019 com 800 crianças e adolescentes de 120 escolas públicas e privadas. Um extenso questionário perguntando o contato das crianças e adolescentes com as polícias, foi aplicado nesse período.

Considerando os anos pesquisados, 21,5% das crianças pretas disseram já terem sido revistadas por policiais, enquanto entre os brancos o percentual foi de 8,33%; e 9,74% entre os pardos. A discrepância entre a abordagem de crianças pretas e brancas também aparece quando se trata da condução para delegacia ou de agressões policiais. Esses números me fazem lembrar a metade da década de 70,  período este que deveria ter uns 12, anos de idade, época que eu vivia em São Mateus, bairro periférico da capital cidade região de altos índices de violência em números que persistem por lá até hoje.

O famoso, “mão na cabeça aí vagabundo!”, da primeira batida policial, não dá para esquecer, os minutos (poucos ou muitos), que se tem uma arma mirada para a cabeça com 11 ou 12 anos de idade te marcarão para sempre, principalmente quando cruzar com uma viatura da polícia no caminho.

Neste período outros fatos ainda guardo em minha memória de adolescente, em São Mateus, divisa com o ABC paulista, local de grandes manifestações metalúrgicas do final dos anos de 1970 que desafiaram o regime militar. Eram manifestações reprimidas também por um tal “esquadrão da morte” – polícia política do Regime que tinha naquele bairro um dos locais de sua “desova”. Então, outro fato comum no caminho da escola ainda criança e cruzava, com corpos atirados no chão, que os adultos diziam serem vítimas do esquadrão da morte.

Quando recordo aqueles anos de chumbo, lembro de muitos amigos quase crianças que não ultrapassaram essa fase da dupla jornada de estudo e trabalho para ajudar em casa, dos que também optaram por um sonho de riqueza fácil e uma vida curta, dos que o álcool e outras drogas, potencializado pela falta de perspectiva os levou, dos que desapareceram e continuam desaparecendo todos os dias deixando milhares de mães, irmãos, amigos na dor e desespero. 

Todos, com uma coisa em comum, em geral a cor da pele e a falta de oportunidades, vítimas de décadas de abandono do Estado brasileiro. Situação essa  que esses dados da USP mostram que, apesar das políticas públicas de combate ao racismo como leis, cotas, secretarias, ministérios e diversas outras ações linkadas a um maior debate na sociedade brasileira há muito ainda que se avançar, pois os números mostram que com relação ao racismo contra crianças negras, pouco ou nada mudou.

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