Influenciadoras investigadas por dar banana e macaco de pelúcia a crianças negras no Rio respondem a 5 inquéritos
Quatro registros são por injúria racial na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), e um na 74ª DP, em Alcântara, São Gonçalo.
As influenciadoras digitais Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves – investigadas após dar banana e macaco de pelúcia a crianças negras no Rio –, respondem a cinco inquéritos na Polícia Civil, sendo quatro por injúria racial na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), e um registrado apenas como injúria na 74ª DP, em Alcântara, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio.
O caso das crianças, registrado inicialmente como uma investigação, foi desmembrado após a titular da (Decradi), Rita Salim, apurar que as ações foram gravadas em dias diferentes.
Assim, Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves serão investigadas por injúria racial contra um menino negro, que recebe uma banana em um vídeo, e cuja mãe já foi ouvida na especializada; e em outro inquérito por darem um macaco de pelúcia a uma menina negra. A mãe da menor será ouvida nos próximos dias.
Veja os outros inquéritos contra as influenciadoras:
Investigação por suspeita de injúria racial contra motorista de app
Em 2021, Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves gravam um vídeo durante uma corrida em um carro de aplicativo e dizem que o cabelo do motorista cheira mal.
Evaldo Jesus Faria, de 50 anos, prestou depoimento na Decradi na segunda-feira (12), disse que não se sentiu ofendido, que a “brincadeira” foi combinada antes da gravação e que ele recebeu pelo vídeo.
Investigação por suspeita de injúria racial contra uma mulher
Já em vídeo de maio de 2023, Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves fazem novamente a “brincadeira” do presente misterioso e dão uma carteira para uma vendedora de rua abrir. Ao fazê-lo, ela descobre que ele está recheado de banana amassada.
Em uma segunda parte do vídeo, as influenciadoras orientam a vendedora a abrir um compartimento da carteira, onde ela encontra R$ 50. A investigação sobre esse vídeo também está na Decradi.
Investigação por suspeita de injúria
A Polícia Civil localizou mais um registro por injúria feito contra Kérollen e Nancy na 74ª DP, em Alcântara, São Gonçalo. Uma mãe teria procurado a delegacia para registrar que as influenciadoras teriam abordado seu filho e feito uma gravação sem o seu consentimento. Como a Civil ainda não analisou o conteúdo do vídeo, o caso foi registrado apenas como injúria.
O que dizem as influenciadoras
Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves depuseram na segunda-feira (12), na Decradi, sobre o caso envolvendo Evaldo e as duas crianças já identificadas.
O g1 apurou que as influenciadoras negaram o crime, também disseram que os vídeos e as supostas trollagem são pré-combinadas com os envolvidos, inclusive com as crianças.
A delegada Rita Salim, titular da Decradi, colocou os inquéritos envolvendo as crianças em sigilo, já que envolve menor de idade.
Procurada para falar sobre os inquéritos, a advogada que representa as influenciadoras, disse “que não comenta seus casos, nem dá entrevistas, e que todos estão sob sigilo”. Mas apenas os que envolvem menores de idade se encontram nessa condição.
Quem são Kérollen e Nancy
Kérollen e Nancy passaram a ser investigadas pela Decradi por vídeos em que aparecem entregando um macaco de pelúcia, uma banana e dinheiro para crianças negras abordadas na rua.
Nancy e Kérollen se apresentam como “mãe e filha divertindo você”, mas em diversos vídeos afirmam ser meias-irmãs de pais diferentes — em um deles, Nancy conta ter pegado a caçula para criar depois que a mãe das duas avisou que daria Kérollen para adoção.
Em outra publicação, Nancy afirma ter sido garota de programa “por necessidade” e “para cuidar de Kérollen”.
‘Racismo recreativo’
Nos inquéritos abertos na Decradi, os investigadores vão apurar se Kérollen e Nancy praticaram crime de racismo ou injúria racial e se também infringiram o Estatuto da Criança e do Adolescente.
O caso veio à tona após a advogada Fayda Belo, especialista em direito antidiscriminatório, denunciar os vídeos — já apagados dos canais. A advogada destacou que as cenas apresentam o chamado “racismo recreativo”, que ocorre quando alguém usa de “discriminação contra pessoas negras com intuito de diversão”.
“O racismo recreativo incita a discriminação e tira de nós, pessoas negras, o status de pessoa, nos animaliza e nos desumaniza. Seguirei com a denúncia dentro da lei e me coloco à disposição para esclarecimentos”, finaliza.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) recebeu, até esta quarta-feira (31), 690 comunicações com denúncias contra os vídeos.
Em nota divulgada por sua assessoria jurídica, a dupla disse que “não havia intenção de fazer qualquer referência a temáticas raciais ou a discriminações de minorias” no vídeo.
“Sendo assim, gostariam de se dirigir às pessoas que se sentiram diretamente atingidas, para dizer que não tivemos intenção de as ofender individualmente, nem como gênero, etnia, classe ou categoria a que elas pertençam”, diz um trecho do texto.
O que elas postam
No Instagram e no TikTok, Kérollen e Nancy postam de dois a três vídeos curtos por semana.
A produção alterna cenas de assistencialismo, testagem de produtos de beleza e pegadinhas — ou trollagens, como aparece nas legendas. Nancy também imita a cantora Katy Perry, a quem se compara.
Nos clipes de ajuda, as duas supostamente abordam pessoas aleatoriamente na rua e perguntam se querem dinheiro ou um “presente misterioso” — circunstância dos vídeos da banana e do macaco.
A dupla também leva crianças para lojas de brinquedo e supostamente dão a elas tudo o que elas tocarem.
As duas também gravaram oferecendo R$ 100 ou um beijo de Nancy a quem aceitasse raspar o cabelo. Um idoso diz aceitar e aparece com metade do couro cabeludo à mostra — mas, com os olhos tampados, beija o dedo da influencer e parece acreditar ter sido na boca.
Em alguns vídeos, seguidores questionam a veracidade das cenas. Em um deles, um homem descalço bate no portão da casa das influencers “pedindo socorro” com uma bebê no colo. O rosto dele é cortado, mas a câmera mostra a criança — que muitos apontam ser uma boneca. O clipe termina com a dupla dizendo entregar R$ 2 mil em espécie.