Intolerância religiosa em debate

por FLAVIA CIRINO

RAÍZES – EDIÇÃO 208/2019

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Muito tem se falado em intolerância religiosa, termo que descreve a atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em reconhecer e respeitar diferenças ou crenças religiosas de terceiros. O debate promovido após o lançamento da coleção lendas dos orixás, de Maurício Pestana, na biblioteca parque do rio de janeiro, abriu espaço para um questionamento: até quando vamos discutir e, efetivamente, nada fazer?

Mesmo com a criação de datas especiais — 16 de novembro, Dia Internacional da Tolerância, instituído pela Organização das Nações Unidas em 1996 e 21 de janeiro, Dia Nacional da Intolerância Religiosa, por meio da Lei nº
11.635, de dezembro de 2007 — o respeito ainda parece realidade distante para os adeptos de religiões de matriz africana.

FOTOS: ROSÂNGELA SILVA

É hora – mais do que urgente – de avançar. Reunidos no evento, o babalawo e doutor em História Comparada pela UFRJ, Ivanir dos Santos, a professora doutora Elisa Larkinn, do IpeAfro, o diretor e produtor cultural Rodrigo França, além de Maicol Willian, criador do grupo de estudos para pretos “Dissecando o Racismo”, e da jornalista evangélica Nilza Verônica, debateram o assunto. Destacamos alguns posicionamentos, confira:

FOTOS: ROSÂNGELA SILVA

MAICOL WILLIAN

Trabalho numa escola de educação e dinâmica racial que busca pensar a espiritualidade e acabamos pensando em conteúdos preto e de forma branca. Muitas vezes os terreiros de candomblé, a capoeira são tratados de forma branca. Fazemos um embranquecimento.

Não se pode ter tudo e o mundo é troca. Precisamos entender o que a gente quer ter e o que estamos dispostos a dar para ter. Vivemos numa sociedade racista e a gente aceita ser embranquecido. Há perdas e ganhos nisso.

Mais do que alienar a gente sobre o conteúdo que a gente pensa, Exu é uma metáfora sobre política. É dar para receber. É na figura do menino que a gente aprende que não pode enganar em nome do outro. Se a gente constrói, vem outra pessoa e destrói tudo. Exu e o intermediário entre os dois mundos. A sociedade reflete como as pessoas são tratadas. A gente só aprende com as experiências.

Sabemos quem é o branco e continuamos tratando deles a maneira, tiramos exu de jogada. Educação é sobre doutrinação. Estragamos a criança quando colocamos várias determinações de como ela deve agir. Ela para de seguir a emoção para seguir a razão.

IVANIR DOS SANTOS

A intolerância não é um processo religioso. É político e econômico. Estamos diante de uma batalha política e civil. É uma questão que tem a ver com racismo, poder. É inegável que a intolerância religiosa tem aumentado. Temos um problema da sensação de impunidade. Esses grupos são encorajados por acharem que nada vai acontecer.

Os pentecostais se diferenciam dos reformados pela incorporação do Espírito Santo. Temos que compreender o que está acontecendo para construirmos mecanismos de combate. Combater a intolerância, venha de onde vier, não é combater evangélicos.

Há setores católicos que são extremamente intolerantes. Quando acontece o combate à intolerância religiosa, todos os outros combates às intolerâncias passam a acontecer. Tem que haver ações mais conjuntas para reafirmarmos a liberdade religiosa, de expressão e política.

NILZA VALERIA DO NASCIMENTO

Estar nesse lugar não é confortável. Mas não posso me inibir, deixar de me posicionar e me colocar na posição de vítima. Sou sim evangélica, mas não concordo com muita coisa.

Não somos poucos os evangélicos preocupados com a crescente onda de ódio, intolerância religiosa e de relacionamentos. Não somos poucos e muitas vezes somos silenciados pela indústria gospel e pessoas que, valendo-se do poder econômico, colocam-se como porta-vozes.

Temos tentado mudar e reforçar nos ensinamentos bíblicos que nossa história vem da África. Quem sofre ou sofreu intolerância não pode disseminá-la. Tem o compromisso de tentar combater isso.

RODRIGO FRANÇA

Meu canal de luta é através da Educação. Precisamos, antes de mais nada, tratar a autoestima das crianças negras, fazê-las se enxergarem, sem medo, sem culpa. Tento desconstruir certos valores sociais. Sou do diálogo, mas não fujo à luta. Faço questão, sempre, de reverenciar todos os que estão lá atrás.

FOTOS: ROSÂNGELA SILVA

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