A violência contra a juventude negra no Brasil é uma das expressões mais cruéis do racismo estrutural que permeia a sociedade brasileira. Os números mais recentes revelam um cenário alarmante e, ao mesmo tempo, naturalizado por boa parte da população e das instituições. De acordo com o Atlas da Violência 2024, produzido pelo Ipea em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, pessoas negras representaram 77% dos homicídios registrados no país. A cada 100 pessoas assassinadas, 77 são negras, a maioria delas, jovens entre 15 e 29 anos.
Ainda segundo o estudo, jovens negros têm 2,7 vezes mais chances de serem vítimas de homicídio do que jovens brancos. Esse risco, que já era elevado em anos anteriores, aumentou 15,6% na última década. O Brasil segue convivendo com a morte precoce de milhares de jovens, especialmente nas periferias das grandes cidades, onde a violência urbana, a ausência do Estado e a presença das forças policiais operam de maneira seletiva e, muitas vezes, letal.
As estatísticas revelam que cerca de 60 jovens são assassinados por dia no país. Grande parte dessas mortes ocorre por intervenção de agentes do Estado. Na Bahia, por exemplo, um dos estados com maior população negra do Brasil, quase 33% dos homicídios cometidos por policiais vitimam crianças e adolescentes, e 94,8% dessas vítimas são negras. Isso evidencia uma política de segurança que associa, de maneira perversa, juventude negra à criminalidade, legitimando ações violentas e, muitas vezes, letais por parte das forças de segurança.
A violência também atinge as jovens negras com força. Dados do Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade Racial, elaborado pela Unesco, apontam que meninas negras entre 15 e 29 anos têm mais que o dobro de risco de serem assassinadas em comparação com jovens brancas. Essa disparidade reflete o cruzamento entre racismo e sexismo, que expõe mulheres negras a múltiplas formas de violência física, sexual, institucional e simbólica.
Os fatores que explicam esse quadro são diversos, mas todos estão ligados ao racismo estrutural. Jovens negros enfrentam dificuldades no acesso à educação de qualidade, ao mercado de trabalho formal e a oportunidades de ascensão social. Vivem, em sua maioria, em territórios marginalizados, com acesso precário a serviços públicos e sob constante ameaça da violência armada, tanto do tráfico quanto da polícia.
O genocídio da juventude negra não é apenas um problema de segurança pública, mas uma questão de direitos humanos. É urgente que o Estado brasileiro reconheça essa realidade e adote medidas efetivas de combate à violência racial, como o fortalecimento de políticas públicas específicas, a valorização de iniciativas comunitárias e o controle rigoroso da atuação policial. Também é essencial promover o letramento racial na educação, nos meios de comunicação e nas instituições públicas e privadas, para que a vida dos jovens negros deixe de ser tratada como descartável.
Enquanto a sociedade brasileira não enfrentar com coragem e responsabilidade a raiz desse problema, continuaremos a perder milhares de vidas todos os anos — vidas que tinham sonhos, potencial e direito à existência. O silêncio diante dessa tragédia é também uma forma de violência. E é preciso romper com ele.