Livro infantil com conteúdo racista é denunciado após aprovação pelo MEC

O livro Formiga Amiga, da editora Global, tem sido alvo de denúncias por racismo e reforço de estereótipos negativos. A obra, que estava inscrita no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), descreve a personagem Dulce como uma formiga de corpo preto, com lábios grossos, dentes aparentes e turbante. Em um dos trechos mais criticados, ela é chamada de “negrinha” e comparada a um “capeta”.

A denúncia foi feita pelo professor Gabas Machado, da rede pública de Salvador, que se disse chocado ao se deparar com o material em uma escola. “Quando eu vi a capa, já estranhei. E, ao ler, percebi que a obra reforça estereótipos sobre corpos negros que vêm sendo criticados há anos. Essa caracterização demoniza e animaliza pessoas negras”, explicou.

O livro foi lançado em 2022 como uma nova edição de uma obra clássica de Bartolomeu Campos de Queirós. Na versão anterior, a formiga era representada como um inseto, sem traços humanizados. A atualização, no entanto, trouxe características que associam a personagem a estereótipos raciais.

Após a denúncia, a editora Global afirmou que o livro foi retirado de circulação e desclassificado do PNLD. Contudo, a obra ainda pode ser encontrada em plataformas de venda online, como Amazon e Estante Virtual. Em nota, a editora reconheceu que “houve uma falha” e declarou que a intenção era valorizar a personagem. “A associação com elementos como turbantes foi fruto de ampla pesquisa, mas reconhecemos que a representação extrapola e pode reforçar preconceitos”, disse.

O caso ganhou força nas redes sociais e mobilizou outros educadores e editoras. Um grupo de seis editoras formalizou uma denúncia junto ao MEC e ao FNDE, pedindo a retirada definitiva do livro do programa e medidas para evitar que casos semelhantes aconteçam no futuro.

Rosana Martinelli, representante de uma dessas editoras, destaca a gravidade do episódio. “É inadmissível que, em 2025, um livro com essas características passe por tantos níveis de aprovação e chegue às escolas. Isso machuca, constrange e desrespeita nossas crianças, principalmente as negras”, desabafou.

O professor Gabas, que trabalha com educação antirracista há 15 anos, alerta para as consequências desse tipo de material na formação das crianças. “Não é à toa que muitas crianças negras não se sentem representadas nos livros que chegam às escolas. Precisamos denunciar e combater essa violência desde a raiz”, afirmou.

Ele também reforça a importância de proteger professores que se posicionam contra o racismo na educação. “Muitas vezes, quem denuncia é mais criminalizado do que quem perpetua o preconceito. É uma inversão cruel”, disse.

O caso de Formiga Amiga expõe falhas no sistema de avaliação de livros didáticos e reforça a necessidade de um letramento racial mais amplo entre profissionais da área. Para especialistas, a literatura infantil deve ser um espaço de acolhimento, representatividade e respeito.

Enquanto a repercussão do caso continua, pais, professores e editores esperam que o episódio seja um marco para evitar que estereótipos racistas ainda tenham espaço na educação das futuras gerações.

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