Lucas, um menino de RAÇA.
Um engasgo atravessou a garganta de todos os homens e mulheres negras do país. A cruel espinha não veio da violência policial nas favelas, da fome que insiste companheira, tão pouco da permanente vigilância racista sobre nossos corpos. O entalo brotou e cresceu num programa de entretenimento televiso de confinamento, o Big Brother Brasil 21. A primeira semana de fevereiro fez ecoar vozes famosas, indignadas, de todas as cores e raças, numa pergunta em uníssono: que absurdo é esse? O que estão fazendo com esse menino? Que tipo de tortura psicológica é essa?
Lucas Penteado, paulistano, ator, rapper, ficou conhecido após participar do Movimento Estudantil que aconteceu em São Paulo em 2015, além de fazer parte do elenco do seriado Malhação da Rede Globo.
“Que Revolução tu faz mano, defendendo vagabundo? ”, afirmação do humorista Nego Di numa discussão com Lucas ;”vagabundos” para o humorista são os estudantes secundaristas que ocuparam escolas na capital paulista em 2015 ao lado de muitos professores onde Lucas foi um dos líderes, ou defensores de direitos humanos.
“Eu não quero ser palco para você ser Zumbi dos Palmares! ” – afirmação da capacitada DJ Lumena de Aleluia Santos que possui Mestrado em Psicologia Social pelo Programa de Psicologia Social (PPGPS | UERJ), Especialização em Saúde da Mulher (HESFA | UFRJ) e Especialização em Gênero e Sexualidades pelo Centro Latino Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (CLAM/IMS/UERJ/SPM-PR).
“Quero comer na paz do senhor entendeu? Não quero que você fale enquanto estou comendo, me respeita…você não sabe calar a boca então é melhor sair mesmo… vá a merda, se faça de louco lá fora, pede para sair” – afirmação da rapper Karol Conká, ativista, influencer, apresentadora de TV, no momento que expulsava Lucas da mesa do almoço e determinando que ele só comeria após ela se refastelar na sua refeição.
“… o cara não cala a boca. E eu não vou chamar ninguém para comer, ele que adivinhe a hora que eu terminar. Se fosse louco não estava aqui dentro. Só vai comer quando eu sair da mesa, qualquer coisa me bota no Paredão” – completa Karol
A gratuita bateria de ofensas, ações de racismo, discriminação e preconceito surgiu após “o menino”, na festa, embriagado, propor que dever-se-ia dividir a casa em dois times, tendo como referência a raça. Mesmo após a ressaca e o pós festa, os participantes que Lucas imaginou, seriam do Team Negros, impuseram uma verdadeira blitz de agressões, manipulação de isolamento e desrespeito escancarado. Mesmo sabendo que estavam sendo vistos por todo país.
Na madrugada deste sábado, 06/02, em momento histórico, Lucas protagonizou o primeiro beijo gay da história dos realities. Imediatamente assumiu a bissexualidade e começou a falar sobre o quanto será penoso encarar o julgamento dos amigos e família, e entrou em desespero. Automaticamente a representante maior da causa LGBT + na casa, mestre em psicologia, nos oferta a seguinte pérola:
“Você não é o especial do rolê, você caiu na sua própria cilada, você tá agenciando uma pauta coletiva em prol de um BO que é seu, um “corre” individual…você tá agenciando uma demanda coletiva em prol de uma demanda egoica”, disse Lumens, sem considerar os sentimentos do garoto.
Um dia antes o rapper nacionalmente conhecido por Projota, com sua maturidade de artista participante do Rock in Rio, em show com mais de 2 bilhões de visualizações, imitava com trejeitos caricatos os momentos de infantilidade e ingenuidade de Lucas durante o jogo.
Sóbrio, o menino sempre pediu ajuda e orientação: “como eu posso mudar? ”
Sóbrios, donos de verdades e destinos, os supostos irmãos negros, ditavam regras e determinações, observando a fragilidade emocional do jovem, todos construíram uma estratégia para sua expulsão. No começo da manhã de domingo, 07/02, o menino pegou sua mochila colorida e gritou que abrissem a porta para voltar para casa.
Estranhamente, dias antes, dentro do processo de linchamento e perversidade uma das participantes tomou as dores de Lucas e foi em sua defesa. De forma ofensiva, foi questionada pelo grupo que propaga a verdade sobre consciência negra e negritude, Sarah, a única defensora, falou:
“Eu me senti mal naquela hora… Para mim, você é um menino que está aprendendo e o povo virou muito as costas antes de ver o seu lado. Porque a grande maioria estava indo contra. Ninguém chegou pra você e perguntou o teu lado” – ironicamente Sarah é branca.
Saiu o menino!
Se com um time tão empoderado, consciente, acadêmico, famoso e rico, não conseguimos cuidar de um menino, quem cuidará de todos os meninos, quem cuidará da nossa juventude?
Com homens e mulheres rasos, ditando regras a cada esquina, tomando o discurso sério da causa negra de forma irresponsável, fazendo pequenos shows em programas de TV, construindo argumentos falaciosos e nos expondo a vergonha, vos pergunto: quem cuidará de nós?
Não podemos entregar nossa história ao varejo das redes sociais, tão pouco emudecer, só nós cuidaremos de nós, e dos que diariamente se perdem. Somos responsáveis pelos nossos, somos os responsáveis pelo futuro da RAÇA.
“Tudo que nós tem eh nós” – Emicida