Nem toda homenagem nasce perfeita, mas algumas são necessárias — porque falam de quem abriu caminho quando ninguém queria ouvir. A Pérola Negra do Samba não é apenas um musical: é um ato de reverência a Jovelina Pérola Negra, mulher preta, suburbana, que transformou sua voz em instrumento de luta e sua risada em resistência.
Ver seu nome de volta aos palcos, no Teatro Carlos Gomes, é como acender novamente uma vela em meio à história que o tempo tentou apagar. É lembrar que, antes dos holofotes, Jovelina foi doméstica, mãe solo, mulher de fé — e mesmo assim, nunca deixou de cantar. Cantou como quem desafia o silêncio. Cantou como quem sabia que sua arte tinha peso, cor e propósito.
Interpretada pela talentosa Verônica Afro Flor, a Pérola ganha corpo, voz e presença em cena. Mesmo que o musical não atinja toda a força que a história pede, há algo de profundamente bonito em ver o legado de Jovelina sendo celebrado — porque cada verso dela é um grito de liberdade, e cada samba, uma afirmação de existência.
Jovelina foi — e continua sendo — uma das vozes mais autênticas do pagode carioca. Entre risos, dores e gingado, ela abriu portas para que outras mulheres negras também ocupassem seu espaço na música e na vida.
Talvez o espetáculo não traduza toda a grandeza que ela merecia. Mas só o fato de estarmos falando dela, de trazermos sua memória para o centro da roda, já é um gesto poderoso. Porque Jovelina foi, é e sempre será o brilho que o samba não apaga — a prova viva de que ser preta e mulher no Brasil é, por si só, um ato de arte.