Maurício Pestana: sem inclusão racial não existe ESG

Para os que trabalham com a responsabilidade social, em se tratando de Brasil, a desigualdade racial vem logo em primeiro plano, os índices ESG chegam como grandes aliados e prometem perdurar, trazendo consigo perspectivas de alterar o status quo social e racial em nosso país.

No entanto, é de extrema importância que as organizações compreendam a necessidade de olhar para a responsabilidade social como um dos pilares para solucionar problemas relacionados à sustentabilidade, de formas propositivas, com soluções que tenham impactos a curto, médio e longo prazo. Práticas assertivas, relacionadas ao meio ambiente, só se concretizam se impactarem também comunidades ao redor das organizações e no seu ecossistema de produção e clientela.

Grande parte das empresas assume compromissos de impacto social e, em algumas ações, têm como metas reduzir as desigualdades raciais, ultimamente, mais por pressões da sociedade que está mais exigente com o posicionamento das organizações, com as quais se relacionam e suas soluções frente ao impacto que geram na sociedade.

Quando as empresas passam a se envolver e se responsabilizar para além da ótica do assistencialismo, começam também a enxergar possibilidades de engajar pessoas em suas causas e o resultado é uma sociedade mais sustentável e com maior capacidade para se desenvolver.

O ESG não nasce no Brasil, mas em países mais desenvolvidos, nos quais as instituições estão olhando para dentro, em busca de soluções e estratégias para problemas sociais externos, que afetam as comunidades e o meio ambiente. Em países europeus, por exemplo, é impossível, para as organizações, desassociar qualquer problema social do fluxo de imigrantes.

O número de refugiados chegando à Europa, nos últimos anos, vem, em um primeiro momento, do continente africano, que foi, até pouco tempo, colônia de países como Portugal, França, Inglaterra, Holanda etc. Hoje os europeus sentem a urgência de boas práticas nas áreas sociais, de oferecer ferramentas às bases sociais do país e conseguem enxergar os pontos fracos de sua sociedade, por conta dessa população vulnerável, que faz o caminho de volta, em busca de melhorias, porque foi muito explorada.

Nos Estados Unidos, a responsabilidade social está voltada, na maioria das vezes, para as suas minorias e, por sua vez, também sentem o impacto dos imigrantes, pessoas que foram para o país com a visão de que a América seria a salvação, algo em que se acredita até os dias atuais. Então, o olhar se direciona primeiro às minorias norte-americanas, que não encontraram “seu lugar ao sol”, mesmo tendo nascido no país com a maior economia do mundo. O “S” de social está voltado para negros norte-americanos, latinos, asiáticos, que socialmente são a parcela da população mais vulnerável.

Quando se fala do papel da responsabilidade e impacto social no Brasil, que também passa por uma questão sensível, quando olhamos para os imigrantes haitianos, africanos, congoleses etc., sobretudo, é necessário olhar para o cenário da população negra, que se encontra em posições mais vulneráveis. Aqui, a renda de um trabalhador negro pode chegar a até 50% da renda de um trabalhador branco. A mulher negra é a base da pirâmide social. É inviável pensar em impacto social no Brasil, sem pensar na questão racial. Mesmo com a possibilidade de oferecer programas de capacitação e vagas afirmativas, empresas de todos os setores caem no falido conceito da meritocracia e acabam por oferecer o assistencialismo e a filantropia como soluções muito frequentes, ainda nos dias atuais.

O Fórum Brasil Diverso foi criado há quase 10 anos, para alavancar essa discussão dentro das empresas. Demonstrou em uma de suas edições que, no Brasil, apenas 4,6% das lideranças empresariais e cargos de tomada de decisão são ocupados por pessoas negras. Essa pesquisa, encomendada pelo instituto Ethos com o apoio do BID – Banco interamericano de Desenvolvimento, tem servido de base até os dias de hoje em temas como política antirracista nas empresas, pois pouco ou quase nada mudou. O estudo mostrou na época que, nas 500 maiores empresas globais que movimentam a economia brasileira, não chegava sequer a meia dúzia de CEOs negros comandando essas empresas, realidade inalterada até o presente momento.

Esta semana, em conversa com Luana Ozemela, vice-presidente de Impacto Social no IFood, Cofundadora da BlackWin, que tem se destacado a estudar o assunto, perguntei como mudar este quadro em nossas empresas e a resposta foi taxativa: “É essencial estabelecer metas quantitativas e assumir compromissos públicos com igualdade racial, principalmente nos escalões mais elevados da liderança corporativa”. E continuou: “Investidores internacionais e acionistas demonstram um interesse crescente por empresas que assumem tais compromissos, como é o caso do requisito de relatório da B3 e do nível de diversidade nos conselhos das empresas de capital aberto”. Em resumo: Não há ESG sem inclusão racial.

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