Autenticidade, atitude e posicionamento político marcam Reunião de Matuto, nova parceria entre MD Chefe e Major RD. Misturando estética do Velho Oeste, beats marcantes e letras afiadas, a faixa vai além do entretenimento: traz críticas à perseguição ao rap, ao Projeto de Lei 2625/2025 e à violência policial, ao mesmo tempo em que exalta a autoestima negra e a ocupação de espaços historicamente negados. Em entrevista exclusiva à Revista Raça, MD Chefe fala sobre a conexão com Major RD, a importância de provocar reflexões e como o rap se mantém firme como voz de resistência.
Revista Raça – MD, para começar: o que te motivou a unir forças com o Major RD para criar Reunião de Matuto? E como surgiu a ideia da estética inspirada no Velho Oeste?
MD Chefe – O Major RD é um dos artistas mais autênticos do nosso rap, assim como eu. Então, foi uma junção natural de duas potências autênticas. Apesar de termos discursos diferentes, nossos propósitos se conectam. Ele traz muito do rock para a música dele, lembrando que o rock nasceu com os negros e era uma forma de música gospel para nossa comunidade. Além disso, ele tem uma ligação forte com a cultura country: fazenda, cavalo, cowboy… Já eu trago o universo do uísque e o estilo “mineiro” de me vestir bem. Esses dois mundos conversam muito.
A ideia da estética veio daí. Eu perguntei a ele se poderia usar chapéu de cowboy nesse projeto e ele topou na hora até me deu dois de presente. Misturei com meu estilo, que é mais ajustado, e deu certo. Isso se refletiu no clipe, que tem muito dessa mistura de uísque, charuto e cowboy.
Revista Raça – E qual é a ideia da música? Como ela surgiu?
MD Chefe – O rap é o intérprete e o jornalista da sociedade. Ele fala sobre o que está acontecendo ou sobre a vivência de quem escreve. Estamos num momento polêmico no rap, mas sem deixar de lado o entretenimento. Reunião de Matuto cumpre esse papel: divertir, mas também provocar reflexões e críticas aos ataques que o rap vem sofrendo.
Revista Raça – Na letra, vocês falam sobre “ostentação com propósito”. Como essa visão se conecta com sua trajetória?
MD Chefe – Na verdade, não é ostentação. É autoestima. Quando as pessoas ouvem minhas músicas, quero que se sintam bem, empoderadas. Deus me deu esse dom da voz e uso para transmitir força. Quero colocar o negro em outros patamares. Na música, tem um trecho que diz: “Agora explica o motivo deles serem tão puto comigo: além do fato de eu ser rico, eu sou totalmente esclarecido”. Ser preto, dono de fazenda e de marca de bebida é ocupar espaços onde muitos não esperam ver um negro – e isso incomoda. Eu faço questão de provocar essa mudança de perspectiva.
Revista Raça – A música também traz críticas diretas ao Projeto de Lei 2625/2025. Qual é a sua visão sobre ele?
MD Chefe Essa lei só dá força para quem já é preconceituoso. Muitos nem sabem do que se trata, mas apoiam porque vêm de políticos mal-intencionados. Eles querem a visibilidade que o rap tem, mas não têm projetos que realmente ajudem o povo. O rap está tirando pessoas do crime e dando oportunidades algo que não é obrigação nossa, mas fazemos. Essa perseguição é por incômodo: o rap está em alta e, por isso, tentam atacá-lo.
Revista Raça – E como tem sido resistir diante dessa perseguição ao rap e aos MCs?
MD Chefe – O rap já passou por isso lá fora e vai passar aqui também. É parte da batalha. O importante é não desistir. Resistência é a essência do rap.
Revista Raça – A faixa também cita casos de violência policial. Qual a importância desse tema nas suas composições?
MD Chefe – A violência policial vai além do rap é sobre a realidade da periferia, do homem negro e das questões sociais que enfrentamos. Isso acontece o tempo todo e quase nunca há responsabilização. O rap mantém esse assunto vivo, dá voz a quem não tem voz e mostra que não esquecemos dessas injustiças.
Revista Raça – E sobre a parceria com o Major RD, quais as expectativas para essa música?
MD Chefe – Acho que vai fazer muito barulho. É uma faixa que mistura posicionamento político forte com entretenimento. É boa para shows, tem estética marcante e deve atrair desde quem já conhece nosso trabalho até novos públicos. É para agradar, mas também para incomodar e incomodar é parte do caminho.
Revista Raça – Para encerrar, queria saber como a música entrou na sua vida e qual é a sua relação com o uísque, já que isso faz parte da sua imagem.
MD Chefe – Faço rap desde cedo. Comecei com 12 anos, influenciado pelo skate. Conheci o rap na escola, participei de batalhas de rima e já sabia que seria cantor muito antes de acontecer. Sempre acreditei que nasci artista. Quanto ao uísque, ele se tornou parte da minha identidade artística e do universo que construí ao longo da carreira um símbolo do estilo e da sofisticação que quero transmitir.