Morre Maryse Condé, grande voz negra da literatura francófona, aos 90 anos
Escritora caribenha abordou em seus 30 livros temas como África e a escravidão e dirigiu centro de estudos em Nova York
Grande voz da literatura francófona, a escritora de Guadalupe Maryse Condé morreu na madrugada desta terça-feira (2), segundo informou à AFP seu marido, Richard Philcox.
A causa da morte não foi revelada, mas a escritora já havia sofrido antes um acidente vascular cerebral e tinha uma doença neurológica que a fez a ditar o seu último romance, “O Evangelho do Novo Mundo”.
Nascida em Pointe-à-Pitre em fevereiro de 1934, Maryse Condé abordou em seus 30 livros temas como África, a escravidão, o colonialismo, a diáspora e as múltiplas identidades negras.
Vencedora do New Academy Prize de 2018, um espécie de Nobel alternativo, seu nome foi cotado diversas vezes para o Prêmio Nobel de Literatura pela repercussão e perenidade de livros como “Eu, Tituba: Bruxa Negra de Salem”, “O Coração que Chora e que Ri” e “O Evangelho do Novo Mundo”, publicados no Brasil pelas editoras Bazar do Tempo e Rosa dos Tempos.
Também era muito conhecida nos Estados Unidos, onde viveu por 20 anos em Nova York. Na cidade americana, inaugurou e dirigiu um centro de estudos francófonos na Universidade de Columbia.
“Sempre trabalhei com ela em diferentes editoras e admirava profundamente sua influência, sua coragem. Inspirou muitos escritores a iniciar uma carreira”, declarou à AFP seu editor, Laurent Laffont.
Condé era a mais nova de oito filhos. Até o final de sua adolescência Maryse Condé não havia se percebido negra. Nunca tinha ouvido falar da escravidão nem da África.
Sua mãe, professora, a proibiu de falar crioulo e a obrigou a aprender francês. Somente aos 16 anos, quando chegou a Paris, que se deu conta da barreira que sua cor de pele impunha.
“Quando vim estudar na França descobri os preconceitos das pessoas. As pessoas acreditavam que eu era inferior só porque era negro. Tive que provar a elas que era talentosa e mostrar a todos que a cor da minha pele não importava —o que importa está no seu cérebro e no seu coração”, disse a escritora em entrevista ao jornal The Guardian.
Começou a escrever aos 42 anos, após 12 anos de dificuldades, e conseguiu graças a Richard Philcox, que se tornou seu tradutor.
Em 1976, estreou com “Heremakhonon”, onde expunha as misérias da vida na Guiné, que causou polêmica e chegou a ser retirado de circulação pela virulência de suas críticas; depois “Segu”, editado em dois volumes em 1984 e 1985 —um sucesso de vendas sobre o império bambara no século 19 no Mali, que reflete sobre o caráter destrutivo do colonialismo.
Além dos romances, foi dramaturga, autora de literatura infantil e ensaísta, com destaque para as reflexões de “Victoire, les Saveurs et les Mots”, ou os sabores e as palavras, de 2006, sobre a culinária e sua avó.