Um estudante de Ciências da Computação da UERJ vivenciou nesta quarta-feira (28/05) um episódio emblemático da criminalização da negritude. Gabriel Secundino, 25 anos, foi abordado por um caminhoneiro no Boulevard 28 de Setembro, em Vila Isabel, e acusado de furtar um celular – crime cometido minutos antes por outro jovem.
Dinâmica da acusação racial
Enquanto o real suspeito era detido por agentes do Segurança Presente dentro de uma lotérica, o caminhoneiro – também negro – segurou Gabriel pelo braço insistindo “Foi você que pegou o telefone”. A justificativa baseava-se no relato de uma testemunha que descrevera o autor apenas como “um garoto”.
Os policiais presentes não coibiram a abordagem irregular. Questionaram repetidamente se Gabriel “estava junto” com o fugitivo, mesmo após este escapar correndo sob os olhos dos agentes. O estudante, que caminhava para aulas na UERJ, registrou o momento em que questionou um agente: “Você está me segurando por quê?”, recebendo como resposta a manutenção de sua imobilização.
Repercussão e resistência institucional
Durante o registro do BO na 20ª DP, a delegacia inicialmente omitiu o viés racial. A inclusão do fato só ocorreu após intervenção da advogada do estudante, que exigiu constar no documento: “A confusão ocorreu exclusivamente por ele ser negro transitando na via pública”.
Nas redes sociais, Gabriel desabafou:
“Fui parado, constrangido e acusado de cometer furto porque um garoto preto havia roubado minutos antes na rua. Eu só estava indo para a faculdade, mas num país onde ser negro é crime, eu sou sempre culpado.”
Contradições na versão oficial
Apesar do Segurança Presente afirmar em nota que “impediu agressões” e devolveu o celular furtado, não explicou por que seus agentes mantiveram o foco em Gabriel enquanto o verdadeiro suspeito fugia sob sua vigilância direta. Paralelamente, a Polícia Civil limitou-se a declarar que “diligências estão em andamento”, sem qualquer menção ao constrangimento ilegal sofrido pelo estudante ou ao viés racial da abordagem.
O episódio ocorreu a menos de 500 metros do campus da UERJ, instituição que sedia o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros – ironicamente dedicado ao combate de estereótipos raciais. A proximidade geográfica entre o centro acadêmico e a cena da discriminação expõe a desconexão entre as políticas antirracistas e a realidade cotidiana nas ruas do Rio.