A música perdeu hoje uma das vozes mais importantes de sua história. Jimmy Cliff, referência absoluta do reggae e um dos artistas jamaicanos mais influentes de todos os tempos, morreu nesta segunda-feira (24) após sofrer uma convulsão provocada por um quadro de pneumonia, conforme comunicado compartilhado por sua esposa, Latifa, nas redes sociais. Em mensagem, ela agradeceu o carinho que acompanhou o artista por toda uma vida e pediu privacidade neste momento de despedida.
Jimmy Cliff não foi apenas um cantor: ele foi um pilar cultural, um defensor da paz, um homem que atravessou gerações com uma expressão artística marcada por coragem, afeto e esperança. Sua voz — suave e firme ao mesmo tempo — carregava a alma do povo jamaicano e o peso das histórias que ele ajudou a contar ao mundo.
Clássicos como “You Can Get It If You Really Want”, “Many Rivers to Cross”, “Wonderful World, Beautiful People” e tantos outros formam a trilha que apresentou o reggae e o ska a públicos que jamais tinham ouvido aquele ritmo antes. Ele começou muito jovem, ainda na Jamaica rural, e decidiu, sozinho, ir para Kingston em busca da chance que mudaria sua vida. Não demorou para que seu talento chamasse atenção, abrindo as portas da Island Records e levando a música jamaicana a um cenário internacional que ainda engatinhava.
Seu grande salto veio com “The Harder They Come”, filme que ele protagonizou e cuja trilha assinou. A obra se tornou um marco histórico, não apenas pela música, mas por mostrar a vida, as tensões e a dignidade do povo jamaicano com uma verdade até então inédita no cinema. Foi o momento em que Jimmy Cliff deixou de ser apenas um artista respeitado e se tornou um símbolo global.
O Brasil, porém, teve um papel especial em sua trajetória. Ainda jovem, ele pisou no Maracanãzinho durante o Festival Internacional da Canção e, aqui, compôs “Wonderful World, Beautiful People”, uma das primeiras canções jamaicanas a romper fronteiras. Voltaria ao país muitas vezes: dividiu palco com Gilberto Gil, gravou clipe no Rio, marcou novelas e até construiu laços familiares — sua filha, Nabiyah Be, nasceu em Salvador e hoje brilha no cinema internacional, levando adiante a força da diáspora jamaicana que tanto orgulhava o pai.
Mesmo com o passar dos anos, Jimmy Cliff manteve vivo um olhar atento ao mundo. Seu último single, “Human Touch”, refletia sobre empatia e a necessidade de reconexão humana — temas que ecoaram profundamente no período pós-pandemia. Suas músicas continuam entre as mais ouvidas do reggae, provando que seu legado ultrapassa épocas, estilos e fronteiras.
A morte de Jimmy Cliff deixa um vazio na música mundial, mas seu impacto permanece pulsando nas guitarras jamaicanas, nos palcos brasileiros, nos filmes que mudaram paradigmas e, principalmente, nas pessoas que encontraram força, consolo e esperança em suas letras. Ele transformou dificuldades em poesia, resistência em melodia e identidade em legado.
Como escreveu certa vez: “You can get it if you really want.”
E ele conseguiu, abriu caminhos, tocou vidas e mudou para sempre a história da música.







