A recente popularização de chupetas para adultos na China, impulsionada por redes sociais como o Douyin (o TikTok Chinês), revela um padrão preocupante: a transformação de mecanismos questionáveis de alívio emocional em febres globais sem base científica. Enquanto usuários relatam uma sensação de conforto imediato ao sugar o objeto – comparando-o a um retorno simbólico à segurança da infância -, especialistas alertam para os riscos dessa prática. Além dos evidentes problemas dentários, há o perigo mais sutil da dependência emocional, que pode postergar a busca por tratamentos adequados para a ansiedade, agravando o quadro a longo prazo.
Esta não é a primeira vez que surgem “soluções mágicas” para questões complexas de saúde mental. Nos últimos anos, vimos desde fidget spinners até cobertores pesados serem promovidos como respostas definitivas para o estresse e a ansiedade. O que torna essa moda particularmente alarmante é a mensagem subjacente de que problemas psicológicos profundos podem ser resolvidos com um simples objeto de consumo – narrativa que beneficia algoritmos e comerciantes, mas prejudica quem realmente precisa de ajuda profissional.
As plataformas digitais criaram um ciclo vicioso: primeiro normalizam o sofrimento emocional como inevitável na vida moderna, depois oferecem pseudo-soluções rápidas que funcionam mais como placebos digitais do que como tratamentos efetivos. Esse mecanismo é especialmente perigoso porque desvia as pessoas de estratégias comprovadas de manejo do estresse, mantendo-as em um ciclo de dependência de produtos que apenas mascaram os sintomas sem abordar suas causas reais. A infantilização do coping emocional, como no caso das chupetas, representa um passo ainda mais preocupante nessa espiral.
Por trás dessa tendência, existe toda uma indústria pronta para lucrar com o sofrimento alheio. Empresas já desenvolvem chupetas “estilizadas” para adultos, com designs discretos e campanhas de marketing direcionadas a profissionais estressados. Essa comercialização da ansiedade não é casual – reflete uma economia da atenção que prospera justamente na lacuna entre o que as pessoas realmente necessitam e o que lhes é vendido como alívio. O resultado é uma geração que aprende a gerenciar suas emoções através de hacks virais em vez de buscar apoio profissional qualificado.
Este fenômeno evidencia a urgência de ampliar o acesso a tratamentos de saúde mental adequados. Enquanto os governos não priorizarem políticas públicas nessa área e a mídia continuar tratando questões psicológicas como modas passageiras, as pessoas seguirão buscando refúgio em soluções inadequadas. Não se trata de criticar quem recorre a esses métodos – muitas vezes por falta de alternativas – mas de questionar um sistema que transforma vulnerabilidade emocional em oportunidade de negócio.
A lição que fica é clara: problemas complexos exigem soluções igualmente complexas. A internet pode oferecer alívio momentâneo, mas não substitui o trabalho de profissionais qualificados e o apoio comunitário estruturado. Enquanto as redes sociais continuarem a banalizar a saúde mental, transformando-a em mais um produto de consumo, caberá à sociedade discernir entre paliativos temporários e tratamentos efetivos – porque ansiedade não se cura com chupetas, mas com acesso digno a cuidados profissionais.