Pretos e pardos – a luta continua…

Ao ler o artigo do jornalista Mauricio Pestana (CEO da Revista Raça), “A engenhosa figura do pardo”, que trata sobre as dimensões políticas do Censo de 2022 – “Cor ou Raça da População”, divulgado recentemente pelo IBGE, consolidei minha impressão de que, para avançarmos na luta de combate ao racismo e na consolidação das políticas de ações afirmativas, no Brasil, teremos que apontar nossas flechas para o futuro. E o futuro, para a sociedade brasileira, é um forte e poderoso movimento antirracista, que supere, uma vez por todas, as mazelas do racismo, da intolerância religiosa e da pobreza.

O passado, tão bem descrito, no artigo de Pestana e que nos levou a vitórias contundentes, no combate ao racismo, tanto nas disputas internas do movimento negro, quanto na política em geral, não é mais suficiente para garantir novas vitórias e abrir novos caminhos. O tempo passou e os desafios agora são outros. Mas, é importante ressaltar que o artigo é um vigoroso e fiel testemunho de uma geração que deixa um legado importante para o futuro e da qual, tenho orgulho de ser integrante.

Do mesmo modo, o colorismo radicalizado que viceja nos pequenos, mas poderosos grupos acadêmicos, presentes nas franjas do poder e que divide e fragmenta nossa luta no presente, é o caminho para unificar uma sociedade tão complexa, do ponto de vista racial, como o Brasil e encarar os desafios que se apresentam para o avanço da nossa luta.

Aquilo que está expresso na planilha do IBGE, como pretos e pardos, igual a negro, não é apenas uma conta de somar, como muitos pensam. É resultado de uma longa e árdua luta, da habilidade, da persistência e resiliência de milhares de militantes e organizações negras que compreenderam há quase cinquenta anos atrás, que para a luta antirracista avançar, era necessário unificar o discurso e as políticas, não apenas para aqueles que tinham a melanina acentuada, mas para todos aqueles que haviam sido vítimas, de alguma forma, do processo de escravização e discriminação ao longo da história do nosso país.

Essa estratégia não só neutralizou as teses da “democracia racial”, via miscigenação, onde miscigenar significava a negação da dimensão negra, como também, serviu para atrair para a nossa luta aqueles que serviam de massa de manobra contra a luta de combate ao racismo. É daí que deriva a “auto declaração”, como mecanismo de identificação racial, assim como a amplitude das políticas de ações afirmativas. E que não me venham falar de fraudes, pois não há uma política pública nesse país que não esteja sujeita a esses intempéries, o bolsa família é um exemplo clássico nesse sentido e nem por isso deixou de ser importante e contribuir para a inclusão de milhões e milhões de brasileiros que estavam abaixo da linha pobreza.

Portanto, para avançarmos em nossa luta, teremos que contar com a experiência do passado, sim, mas também, com a ousadia do presente e ter a coragem de romper com as amarras dos extremos que nos paralisa. Para tanto, temos que dar continuidade a luta que favoreça, unifique nosso povo, e que supere de uma vez por todas, nosso grande inimigo que é o racismo. Isso não é obra para “eleitos” pela pureza da cor da pele, nem muito menos pelos “arautos” da miscigenação. É obra para todos aqueles que respeitam a diversidade humana, a igualdade racial e a democracia, no seu sentido mais profundo.

O Censo de 2022, do IBGE, a meu ver, é uma grande oportunidade nesse sentido. Por isso mesmo, não há tabu que não possa ser discutido, não há proposta que não possa ser criticada e não deve haver aliado que seja rejeitado. Mas há algo que não podemos dispensar, sob nenhuma hipótese – a participação popular, em particular da comunidade negra, no rumo das suas vidas e da construção de uma sociedade verdadeiramente democrática.

Colunista: Zulu Araújo

Toca a zabumba que a terra é nossa!

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