Quantas coisas você quis dizer para alguém e não teve tempo ou coragem?
Quando cheguei na última página do livro “A vitória do afeto: cartas”, de Marlon Pires Ramos, publicado em 2022 pela editora Malê, foi essa a pergunta que fiz para mim mesma, enquanto tentava contornar um nó na garganta.
O jovem escritor estabelece durante todo o livro conversas sinceras e, por vezes difíceis, por meio de cartas direcionadas prioritariamente para sua mãe e avô, com mensagens que certamente ele não teve coragem ou tempo para endereçar enquanto estavam vivos.
As mensagens são de um homem-preto-jovem, nascido e criado no Sul do país, que vive com a avó bastante idosa e que começa a apresentar problemas de saúde.
Nesse contexto, ele começa a ganhar o mundo, tendo na bagagem a sua literatura. Aquela literatura expressa nas letras, palavras, livros e nitidamente aquela que é capaz de implodir o “coração” do escritor.
Os textos são puro sentimento, transparecem um desejo enorme de encontro com sua ancestralidade e uma reflexão profunda sobre o que é ser homem-preto-jovem no neste tempo.
É lindo perceber como esse homem-preto-jovem vai se encontrando e se revelando nas cartas direcionadas para sua mãe e avô. Os obstáculos que ele enfrenta pelo simples fato de ser quem é não são ignorados e sim destacados e colocados no devido lugar das masculinidades tóxicas, do racismo e das desigualdades.
Marlon Pires Ramos ginga (“meneio de corpo que constitui o momento inicial e principal do jogo da capoeira”, segundo Nei Lopes, que Marlon tanto admira) com as palavras e vai tentando atravessar ou driblar cada um desses obstáculos com um texto simples, de “papo reto”, profundo e real.
O livro, editado por Vagner Amaro, é diagramado por Maristela Meneghetti, revisado por Louise Branquinho, capa de Dandara Santana e traz ilustração de Paulo Chavonga, orelha de José Falero e última capa de João Marcos Bigon.
É muito bonito de ler!
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